35. A Fuga para o Egito. Ensinamentos sobre a última visão ligada à vinda de Jesus.
9 de junho de 1944.
O meu espírito vê a seguinte cena.
É noite. José dorme em sua cama no seu pequeno quarto. Um sono tranqüilo de quem descansa de muito
trabalho, feito com honestidade e capricho.
Eu o vejo na escuridão do ambiente, rompida apenas por um pouco da luz do luar, que penetra por uma
abertura da janela, encostada, mas não totalmente fechada, como se José tivesse calor ou quisesse ter
aquele pouco de luz, para saber calcular o despontar da alvorada, levantando-se diligente. Ele está deitado
de lado e, no sono, sorri, quem sabe a qual sonho que esteja tendo. Mas, seu sorriso se transforma em preocupação.
Ele suspira profundamente, como se faz quando se tem
um pesadelo, e acorda sobressaltado. José se assenta sobre a cama, esfrega os olhos, e olha ao redor de si.
Olha, depois, para a janela, por onde está entrando a claridade do luar. É noite alta, mas ele pega a roupa,
que está estendida aos pés da cama e, continuando sentado sobre a mesma, a vai vestindo sobre a túnica
branca de mangas curtas que ele trazia sobre a pele. Afastadas as cobertas, põe os pés no chão e procura
as sandálias. Depois ele as calça e amarra. Põe-se em pé e vai até a porta, que está em frente de sua cama,
não a que está de lado e que dá para o salão onde foram recebidos os Magos.
Ele bate à porta, de leve, só um toc-toc, com a ponta dos dedos. José deve ter ouvido que está sendo
convidado a entrar, porque abre com cuidado a porta, e a torna a encostar, sem fazer barulho. Antes de ir
até à porta, ele acendeu uma pequena candeia, de um só bico, e assim tem uma luz para poder andar. Ele
entra. Mas, em um quarto pouco maior do que o seu, e no qual está uma caminha ao lado de um berço, ele
vê uma luzinha já acesa; a chama vacilante, que está a um canto, parece uma estrelinha de uma luz tênue e
dourada, que permite enxergar, mas sem incomodar quem estiver dormindo.
35.2Maria, porém, não está dormindo. Ela está ajoelhada junto ao berço, vestida com sua veste clara, e
está rezando, velando a Jesus que dorme tranqüilo, Jesus que tem a idade em que o vi na visão dos Magos.
É uma criança de cerca de um ano, bonita, rósea e loira, que está dormindo, com a cabecinha de cabelos
encaracolados afundada no travesseiro, e com uma mãozinha com o punho fechado, encostada na garganta.
– Não estás dormindo? –pergunta José, em voz baixa, e admirada–. Por que? Jesus não está bem?
– Oh, não! Ele está bem. Eu estou rezando. Mas certamente depois dormirei. Por que vieste, José?
Maria fala, permanecendo ajoelhada onde estava.
José fala em voz muito baixa, para não despertar o Menino, mas sua voz é agitada.
– Precisamos ir embora logo daqui. Mas logo! Prepara o baú e um saco com tudo o que puder caber
nele. Eu vou preparar tudo o mais, e levarei o mais que puder. Ao romper da aurora, fugiremos. Eu faria
isso até antes, mas preciso falar com a dona da casa…
– Mas, por que esta fuga?
– Depois, eu te falarei melhor. É por causa de Jesus. Um anjo me disse: “Pega o Menino e a mãe, e foge
para o Egito.” Não percas tempo. Eu vou preparar o que puder.
35.3 Não há necessidade de dizer a Maria que não perca tempo. Assim que ela ouviu falar de anjo, de Jesus
e de fuga, compreendeu que está em perigo o seu Filho, pôs-se em pé, branca como se tivesse um rosto de
cera, com uma mão posta sobre o coração, angustiada. Logo começou a mover-se, desembaraçada e ligeira,
e a arrumar as roupas no baú e num grande saco, que ela estendeu sobre o leito, e que ainda não foi usado.
Certamente está aflita, mas não perde a cabeça, e faz tudo apressadamente, mas com ordem. De vez em
quando, ao passar por perto do berço, olha para o Menino, que está dormindo sem saber de nada.
– Estás precisando de ajuda? –pergunta-lhe José, de vez em quando, pondo a cabeça para dentro da
porta, que está entreaberta.
– Não, obrigada –responde sempre Maria.
Somente quando o saco está cheio, e fica pesado, é que ela chama José para ajudá-la a fechá-lo e
levantá-lo da cama. Mas José não quer ser ajudado e faz tudo sozinho, pegando o grande volume, e levando o para o seu quartinho.
– Pego também as cobertas de lã? –pergunta Maria.
– Pega o mais que puderes. Porque o que ficar estará perdido. Por isso, o mais que puderes, apanha-o!
Para nós vai ser bom, porque… porque teremos pela frente uma longa viagem, Maria!…
José fica muito sentido, ao ter que dizer isso. Pode-se imaginar como está Maria. Suspirando, ela vai
dobrando suas colchas e as de José e ele as amarra com uma corda:
– Vamos deixar os acolchoados e as esteiras –diz ele, enquanto amarra as colchas–. Ainda que eu levasse
três burrinhos, não posso sobrecarregá-los demais. Temos que fazer uma longa e incômoda viagem, uma
parte pelas montanhas, e outra pelo deserto. Cobre bem Jesus. As noites serão frias tanto nas montanhas,
como no deserto. Apanhei os presentes dos Magos, porque eles nos serão úteis lá embaixo. Tudo o que eu
tiver gastarei para comprar os dois burrinhos. Nós não podemos mandá-los de volta, e por isso eu preciso
adquiri-los. Eu vou, sem ficar esperando o romper da aurora. Sei onde procurá-los. Tu, acabas de preparar
tudo.
E sai. Maria recolhe ainda alguns objetos e, depois de ter ido ver Jesus, sai e volta com duas pequenas
vestes que parecem estar ainda úmidas, talvez tenham sido lavadas no dia anterior. Ela as dobra e envolve
em um pano e as ajunta com as outras coisas. Já não há mais nada.
Ela olha ao redor e vê um brinquedo de Jesus em um canto: é uma ovelhinha entalhada em madeira. Ela
a pega com um soluço, e a beija. A madeira está com os sinais dos dentinhos de Jesus, e as orelhas da
ovelhinha estão mordiscadas. Maria acaricia aquele objeto sem valor, feito com uma madeira clara e
comum, mas que para ela é de grande valor, porque lhe fala do afeto de José por Jesus e lhe fala também do
seu Menino. Por isso o põe também junto com as outras coisas sobre o baú já fechado.
35.4 Agora, já não há mais nada mesmo. Só falta Jesus, que ainda está em seu bercinho. Maria acha que é
bom prepará-Lo também. Vai ao berço e o sacode um pouco para despertá-Lo. Mas Ele dá apenas um leve
sinal, e virando-se para o outro lado, continua a dormir. Maria o acaricia de leve, sobre os caracoizinhos.
Jesus abre a boquinha para um bocejo. Maria se inclina e o beija na face. Jesus acaba de despertar. Abre os
olhos. Vê a mamãe, e sorri, e estende as mãozinhas para o seio dela.
– Sim, amor da mamãe. Sim, o leite. Antes da hora habitual… Mas Tu estás sempre pronto para sugar
tua mamãe, meu santo cordeirinho!
Jesus ri e brinca, agitando os pezinhos para fora das cobertas, agitando os braços com uma daquelas
alegrias de criança, tão bela de se ver. Ele apóia os pezinhos sobre o estômago da mãe, curva-se como um
arco e apóia também a cabecinha loira sobre o seu seio e, depois, se atira para trás, rindo, com as
mãozinhas agarradas aos cordõezinhos que ajustam o vestido ao pescoço de Maria, procurando abri-lo. Em
sua camisinha de linho Ele está muito bonito, gorducho, rosado como uma flor. Maria se inclina e, estando
assim por cima do berço como uma proteção, chora e sorri ao mesmo tempo,
enquanto o Menino balbucia aquelas palavras, de todos os bebês, que não são palavras, e entre as quais
ouve-se já clara e repetidamente a palavra “mamãe”. Ele olha para ela, admirado por vê-la chorar. Estende
uma mãozinha para as lágrimas que caem, e se deixa molhar por aquelas carícias. Gracioso, torna a
apoiar-se no seio materno, e se encolhe todo, acariciando-o com sua mãozinha. Maria o beija por entre os
cabelos, e o pega no colo, senta-se e o veste. O vestidinho de lã já está posto,
e as sandalinhas também. Maria lhe dá de mamar, Jesus suga contente o bom leite de sua mamãe e, quando
percebe que da direita está vindo menos, procura a esquerda, ri ao fazer isso, olhando de alto a baixo para
sua mamãe. Depois adormece de novo sobre o seio dela. Sua bochecha rosada e gorducha está ainda contra
o seio branco e redondo. Maria se levanta, lentamente, e o coloca sobre a colcha de seu leito. Cobre-o com o seu manto. Volta ao
berço e dobra as pequenas cobertas. Fica pensando se não será bom pegar também o pequeno colchão. É
tão pequeno! Pode-se levar. Então, Ela o coloca, junto com o travesseiro, perto das coisas já postas sobre o
baú. Chora sobre o berço vazio a pobre mãe, que está sendo perseguida com seu Filho.
35.5 José já está de volta.
– Estás pronta? Jesus está pronto? Pegaste as suas cobertas, a sua caminha? Não podemos levar o berço,
mas pelo menos que Ele tenha o seu pequeno colchão, pobre Pequenino, que procuram a sua morte!
– José!
Maria dá um grito, enquanto se agarra ao braço de José.
– Sim, Maria, a sua morte. Herodes o quer morto… porque tem medo… por causa do seu reino humano,
ele tem medo deste Inocente, aquela fera imunda. Que irá ele fazer, quando ficar sabendo que o Menino
fugiu, eu não sei. Mas nós já estaremos longe. Não creio que ele queira se vingar, procurando-o até na
Galiléia. Já lhe seria muito difícil descobrir que nós somos galileus, e mais ainda, que nós somos de Nazaré,
e quem é que somos exatamente. A não ser que Satanás o ajude, para agradecê-lo por ser-lhe um servo fiel.
Mas… se isso acontecesse… Deus nos ajudará do mesmo modo. Não chores, Maria. Ver-te chorar é para
mim uma dor bem mais forte do que a de ter que ir para o exílio.
– Perdoa-me, José. Não é por mim que eu choro, nem pelas poucas coisas que vamos deixar. Eu choro
por ti… Já tiveste que sacrificar-te tanto! E agora tornas a ficar de novo sem clientes e sem casa. Quanto eu
custo para ti, ó José!
– Quanto? Não, Maria. Tu não me custas nada. Tu me consolas. Sempre. Não fiques pensando no dia de
amanhã. Nós temos as riquezas dos magos. Elas nos ajudarão nos primeiros tempos. Depois, eu acharei
trabalho. Um operário honesto e que tenha capacidade, logo abre caminhos. Já viste como foi aqui. As horas
não me bastam para o trabalho que tenho.
– Eu sei. Mas, quem te aliviará da saudade?
– E a ti, quem te aliviará da saudade daquela casa de que tanto gostas?
– Jesus. Tendo-o, tenho o que lá tive.
– E eu, tendo Jesus, tenho a pátria a qual tenho esperado até a poucos meses. Tenho o meu Deus. Estás
vendo como não vou perder nada do que me é mais querido sobre todas as coisas. Basta que salvemos a
Jesus, que tudo ficará conosco. Mesmo que não tivéssemos mais de ver este céu, estes campos, nem aqueles
ainda mais queridos da Galiléia, teríamos sempre tudo, porque o temos. Vem, Maria, que o amanhecer
está chegando. É hora de irmos saudar a nossa hospedeira e pegar as nossas coisas. Tudo irá bem.
Maria se levanta, obediente. Envolve-se no manto, enquanto José está fazendo um último embrulho, e
depois sai, transportando-o. Maria soergue delicadamente o Menino, e o envolve com um xale, apertando-o contra o coração. Olha
para as paredes que a hospedaram durante alguns meses, e, com uma mão, toca nelas de leve. Feliz casa,
que mereceu ser amada e abençoada por Maria!
Ela sai. Atravessa o pequeno quarto, que era de José, e entra no salão. A dona da casa, em lágrimas, a
beija e saúda, e, levantando uma das extremidades do xale, beija na fronte o Menino, que está dormindo
tranqüilo. Descem pela escadinha externa.
Vem chegando uma primeira claridade da aurora, quando se começa a ver alguma coisa. Naquela pouca
luz, pode-se ver três burrinhos. O mais robusto está carregado com as alfaias. Os outros, estão selados. José
faz força para acomodar bem o baú e os embrulhos sobre a albarda do primeiro. Vejo as suas ferramentas
de carpinteiro, amarradas em pacotes, dentro do saco.
Ainda há saudações e lágrimas. Depois Maria monta no seu burrinho, enquanto a dona da casa segura
Jesus no colo, e o beija ainda, devolvendo-O depois a Maria. José monta também, tendo antes amarrado o
seu jumento ao outro jumento, que vai com a bagagem, a fim de ficar com a mão livre para segurar o
burrinho de Maria, pelo cabresto.
A fuga tem início, enquanto Belém, que sonha ainda com a fantástica cena dos Magos, dorme quieta,
sem saber o que a espera.
E a visão cessa assim.
35.7 Jesus diz:
– Também as visões desta série terminam assim. Em boa paz com os doutores difíceis, viemos te
mostrando as cenas que precederam, que acompanharam e que se seguiram à minha Vinda, não pelas
cenas em si mesmas, pois são muito conhecidas, por mais que tenham sido alteradas, por elementos
sobrepostos através dos séculos, sempre por causa daquele modo de ver humano que, para dar maior
louvor a Deus, e por isso é perdoado, torna irreal o que é tão belo, se for deixado como é. Porque a minha
Humanidade e a de Maria não ficam por isso diminuídas, assim como não fica ofendida a minha Divindade e
a Majestade do Pai e o Amor da Santíssima Trindade, por uma visão das coisas em sua realidade, mas, ao
contrário, esplendem os méritos de minha mãe e a minha humildade perfeita. Assim como daí é que fulgura
a bondade onipotente do eterno Senhor. Mostramos estas cenas para poder aplicar a ti e aos outros o
sentido sobrenatural, que surge daí, dando-vos como norma de vida.
O Decálogo é a Lei. O meu Evangelho é a doutrina que vos torna mais clara essa Lei e mais desejável
para ser seguida. Bastariam esta Lei e esta Doutrina para fazer os homens santos. Mas vós estais tão
embaraçados com a vossa humanidade, que (na verdade, em vós ela ultrapassa
demais ao espírito) que não podeis seguir por estas vias, sem cair; ou então, parar, desencorajados. Dizeis a
vós e a quem queria fazer que vos adiantásseis, citando-vos os exemplos do Evangelho: “Jesus, Maria, José
(e assim por diante todos os santos) não eram como nós. Eles eram fortes, foram logo consolados em suas
dores, até nas pequenas dores que sentiram! Eles não sentiam paixões. Eram já seres fora da terra.”
Ah! Aquelas pequenas dores! Ah! Não sentiam as paixões!
35.8 A dor foi para nós a amiga fiel, e teve todos os mais variados aspectos e nomes.
As paixões… Não useis erradamente um vocábulo, chamando de “paixões” os vícios, que vos
desencaminham. Chamai-os sinceramente de “vícios” e, além disso, capitais. Quanto aos vícios, não é que
os ignorássemos. Nós tínhamos olhos e ouvidos, para ver e ouvir, e Satanás fazia dançar esses vícios à
nossa frente, mostrando-os nas obras, com a sua imundície, ou tentando-nos com as suas insinuações. Mas
a nossa vontade, inclinada a tornar-nos agradáveis a Deus, fazia com que aquela imundície e aquelas
insinuações, em vez de satisfazerem o objetivo de Satanás, provocasse o contrário. Quanto mais ele
trabalhava, mais nós nos refugiávamos na luz de Deus, por repugnância das trevas lamacentas, colocada
diante dos nossos olhos carnais ou espirituais.
Nós não ignoramos as paixões, no sentido filosófico. Nós amamos a pátria, com a nossa pequena Nazaré,
cidade que amamos mais do que qualquer outra da Palestina. Nós sentimos afeto por nossa casa, pelos
parentes e amigos. Por que não haveríamos de sentir? Não nos tornamos escravos deles, porque nada nos
deve possuir, a não ser Deus. Mas fizemos deles bons companheiros. Minha mãe exultou de alegria, quando,
quatro anos depois, voltou a Nazaré e pôs o pé em sua casa,
podendo beijar aquelas paredes, dentro das quais o seu “sim” lhe abriu o ventre para receber o Embrião de
Deus. José saudou com alegria parentes e sobrinhos, crescidos em número e idade, e se alegrou ao ver-se
imediatamente lembrado pelos concidadãos, também por sua capacidade profissional. Eu próprio fui
sensível às amizades e sofri, como uma crucificação moral, pela traição de Judas. Que dizer de tudo isso?
Nem minha mãe, nem José preteriram a casa ou os parentes, à vontade de Deus.
35.9 E Eu não poupei palavras, quando foi preciso, mesmo quando
elas atraíam o ódio dos hebreus e a antipatia de Judas sobre Mim. Eu sabia (e teria podido fazê-lo) que
teria bastado dinheiro para subjugá-lo a Mim. Não a Mim como Redentor, mas a Mim riqueza. Eu que
multipliquei os pães, podia multiplicar também o dinheiro, se quisesse. Mas Eu não tinha vindo procurar
satisfações humanas. De ninguém. Muito menos, dos que foram chamados por Mim. Eu havia pregado a
necessidade do sacrifício, do desapego, de uma vida casta, de posições humildes. Que Mestre e que Justo
teria sido, se tivesse dado dinheiro para alimentar o sensualismo mental e físico de alguém, como único
meio para segurá-lo?
No meu Reino, os grandes se tornam assim, fazendo-se “pequenos.” Quem quer ser “grande” aos olhos
do mundo, não está preparado para reinar no meu Reino. Esse é palha para a cama dos demônios. Porque a
grandeza do mundo está em contraste com a Lei de Deus.
O mundo chama “grandes” os que, com meios quase sempre ilícitos, sabem ocupar as melhores posições
e, para conseguirem isso, fazem do próximo um degrau, sobre o qual sobem, pisando nele. Chama
“grandes” aqueles que sabem matar para reinar, matar moral ou materialmente e, pela extorsão,
conseguem posições e lugares, e enriquecem, sugando o sangue dos outros em suas riquezas particulares
ou coletivas. O mundo muitas vezes chama os delinqüentes de “grandes.” Não. A “grandeza” não está na
delinquência. Está na bondade, na honestidade, no amor, na justiça. Vede os vossos “grandes”, que frutos
envenenados vos oferecem, colhidos no seu malvado e demoníaco pomar interior!
35.10 A última visão, pois eu quero falar dela e deixar de falar de outros assuntos que são tão inúteis, e o
mundo não quer ouvir a verdade que lhe interessa, é uma visão que ilumina um ponto particular, citado
duas vezes no Evangelho de Mateus, numa frase repetida duas vezes: “Levanta, pega o Menino e sua mãe, e
foge para o Egito.” “Levanta, pega o Menino e a mãe Dele, e volta para a terra de Israel.” E, como viste,
Maria estava sozinha com o Menino no quarto.
A virgindade de Maria após o parto e a castidade de José são muito combatidas, por aqueles que, por
serem lama podre, não admitem que alguém possa ser asa e luz. São infelizes, com coração tão corrompido,
com mente que se prostituiu tanto à carne, que se tornaram incapazes de pensar que alguém como eles
possa respeitar a mulher, ver nela a alma e não a carne, elevando-se a si mesmos, vivendo em uma
atmosfera sobrenatural, apetecendo-se de Deus, e não da carne.
Pois bem. Aos negadores do belo, a estes vermes, incapazes de se tornarem borboletas, a estes répteis
cobertos pela baba de sua libidinagem, incapazes de compreender a beleza de um lírio, a estes Eu digo que
Maria foi e permaneceu virgem, e que só sua alma foi casada com José, como o seu espírito se uniu
unicamente ao Espírito de Deus e, por obra Dele, ela concebeu o seu Único Filho: Eu, Jesus Cristo,
Unigênito de Deus e de Maria.
Isto não é uma tradição que floresceu mais tarde, por um amoroso respeito para com a Bem-Aventurada,
que foi minha mãe. Mas é uma verdade que, desde os primeiros tempos, foi conhecida. Mateus não nasceu
séculos depois. Ele foi contemporâneo de Maria. Mateus não era um pobre
ignorante, que tivesse vivido nas selvas, com facilidade de acreditar em qualquer história. Era um fiscal da
receita, como diríeis hoje, ou um cobrador de gabelas, como naquele tempo dizíamos. Ele sabia ver, ouvir,
compreender, separar o verdadeiro do falso. Mateus não ouviu as coisas por meio de terceiros. Mas ele as
recolheu dos lábios de Maria, à qual o seu amor pelo Mestre e pela verdade o havia levado a fazer
perguntas.
Não posso chegar a pensar que esses negadores da inviolabilidade de Maria pensem que ela tenha
podido mentir. Os meus próprios parentes a teriam podido desmentir, se ela tivesse tido outros filhos, pois
Tiago, Judas, Simão e José eram condiscípulos de Mateus. Por isso seria fácil confrontar as versões, se
outras houvessem. Mateus nunca diz: “Levanta e pega tua mulher”; ele diz: “Pega a mãe Dele.” Antes diz:
“Virgem desposada a José”, “José, seu esposo”.
35.11 Não me venham dizer que isso era um modo de falar dos hebreus, como se dizer a palavra “mulher”
já fosse uma infâmia. Não, negadores da Pureza. Desde as primeiras palavras do Livro
[60], se lê: “… e se
unirá à sua mulher”. Ela é chamada “companheira”, até o momento da consumação sexual do casamento;
mas depois é chamada “mulher”, em diversas passagens e em diversos capítulos. E assim acontece com as
esposas dos filhos de Adão. É assim que Sara é chamada “mulher” de Abraão: “Sara, tua mulher”; e: “Toma
tua mulher e as tuas duas filhas” foi dito a Ló. E no livro de Rute está escrito: “A moabita, mulher de
Maalon.” E no primeiro livro dos Reis está dito: “Elcana teve duas mulheres”; e, ainda mais: “depois, Elcana
conheceu sua mulher Ana”; e ainda: “Eli abençoou Elcana e a mulher dele.” E sempre no livro dos Reis foi
dito: “Bate-Seba, mulher de Urias, o heteu, tornou-se mulher de Davi, e lhe deu um filho.” O que se lê no
livro azul de Tobias, aquilo que a Igreja canta para vós nas vossas núpcias, para aconselhar-vos a serem
santos no matrimônio? Lê-se: “Ora, quando Tobias chegou, com a mulher e com o filho…”; e ainda: “Tobias
conseguiu fugir com o filho e com a sua mulher.”
Nos Evangelhos, isto é, nos tempos de Cristo, nos quais se escrevia relativamente àqueles tempos
antigos em linguagem moderna, não havendo, portanto necessidade de se pensar em erros de transcrições,
foi dito pelo próprio Mateus no cap. 22: “… o primeiro, tendo-a tomado por mulher, morreu e deixou a
mulher ao irmão.” Marcos, no cap. 10: “Quem repudia a mulher…” Lucas chama Isabel de mulher de
Zacarias, quatro vezes em seguida, e no oitavo capítulo diz: “Joana, mulher de Cusa.”
Como estais vendo, não era este nome um vocábulo proscrito para quem estava nos caminhos do
Senhor, um vocábulo imundo que não era digno de ser proferido e, muito menos, escrito onde se trata de
Deus e das suas admiráveis obras. O anjo, dizendo: “o Menino e a mãe Dele”, vos demonstra que Maria foi
mãe verdadeira, mas não foi mulher de José. Ela permaneceu sempre: a virgem desposada a José.
Este é o último ensinamento destas visões. É uma auréola que resplende sobre a cabeça de Maria e de
José. A virgem imaculada. O homem justo e casto. Os dois lírios entre os quais eu cresci, ouvindo só
fragrâncias de pureza.
35.12 A ti, pequeno João
[61], eu poderia falar sobre a dor de Maria por seu duplo afastamento de sua casa e
de sua pátria. Mas não há necessidade de palavras. Compreendo que seja isso, e disso desfaleces. Dá-me a
tua dor. Só quero isto. É mais do que qualquer outra coisa que me possas dar. Hoje é sexta-feira, Maria.
Pensa na minha dor e na de Maria sobre o Gólgota, para que possas suportar a tua cruz.
A paz e o nosso amor fiquem contigo.
1,1-2.19; 2,20; 2 Samuel 11,27; Tobias 1,9.20.
[61] pequeno João, é o mais recorrente entre os nomes dados a Maria Valtorta. A sua explicação encontra-se em 70.8/9 e em 638.2.
Dê seu testemunho sobre seu encontro com a Divina Vontade