Preparação para a Ceia Pascal.
(Quinta-feira Santa, 13 de Nisan ou 29 de Março; Jesus na idade de 33 anos, 18 semanas menos 1 dia)
Foi ontem à noite que se efetuou em Betânia e a última e grande refeição de Nosso Senhor e dos seus amigos, em casa de Simão, curado da lepra por Jesus e durante a qual Maria Madalena ungiu Jesus pela última vez. Judas, indignado com isso, correu a Jerusalém, onde negociou ainda uma vez com os príncipes dos sacerdotes, para entregar-lhes Jesus. Depois da refeição, voltou Jesus à casa de Lázaro e uma parte dos discípulos dirigiram-se à albergaria, situada fora de Betânia. Nicodemos veio ainda de noite à casa de Lázaro, onde teve longa conversa com o Senhor; voltou a Jerusalém antes do amanhecer, acompanhado numa parte do caminho por Lázaro.
Os discípulos já tinham perguntado a Jesus onde queria comer o cordeiro pascal. Hoje, antes da madrugada, Nosso Senhor mandou vir Pedro e João e falou-lhes muito de tudo que deviam comprar e preparar em Jerusalém; disse-lhes que, subindo o monte Sião, encontrariam um homem com um jarro de água. (Eles já conheciam esse homem, pois fora quem já na última Páscoa, em Betânia, preparara a ceia de Jesus; por isso diz S. Mateus: um certo homem). Deviam segui-lo até a casa em que morava e dizer-lhe: “ O Mestre manda avisar-te que seu tempo está perto e que quer celebrar a Páscoa em tua casa”. Deviam pedir que lhes mostrasse o Cenáculo que já estaria preparado e fazer-lhe depois todos os preparativos necessários.
Vi os dois Apóstolos subirem a Jerusalém, seguindo um barranco ao Sul do Templo e subirem ao monte Sião pelo lado setentrional. Ao lado Sul do monte do Templo havia algumas fileiras de casas; seguiram um caminho que passava em frente destas casas, ao longo de um ribeiro, que corria no fundo do barranco e os separava das casas. Tendo chegado à altura de Sião, que é mais alto do que o monte do Templo, dirigiram-se a um largo um pouco em declive, na vizinhança de um velho edifício, cercado de pátios; ali, no largo, encontraram o homem que lhes fora indicado, seguiram-no e perto da casa lhe disseram o que Jesus lhes ordenara.
Ele se regozijou muito de os ver e, ouvindo o recado, respondeu-lhes que a refeição já lhe tinha sido encomendada (provavelmente por Nicodemos), sem que soubesse para quem era, mas que muito lhe agradava saber que era para Jesus. Esse homem era Elí, cunhado de Zacarias de Hebron, o mesmo em cuja casa Jesus anunciara, no ano anterior, em Hebron, a morte de S. João Batista. Tinha só um filho, que era Levita e amigo de Lucas, antes deste se juntar a Jesus, anunciara, no ano anterior, em Hebron, a norte de S. João Batista. Tinha só um filho, que era Levita e amigo de Lucas, antes deste se juntar a Jesus, e além desse, também 5 filhas solteiras. Todos os anos ia com os criados à festa e, alugando uma sala, preparava a Páscoa para as pessoas que não tinham casa em Jerusalém. Neste ano tinha alugado um cenáculo, pertencente a Nicodemos e José de Arimatéia. Mostrou aos dois Apóstolos a sala e o arranjo interior.
O Cenáculo ou Casa da Ceia
Ao lado sul do monte Sião, perto do castelo abandonado de Davi e do mercado situado na subida, à leste desse castelo, se acha um velho e sólido edifício, entre duas fileiras de árvores copadas e no meio de um pátio espaçoso, cercado de muros fortes. A direita e à esquerda da entrada há ainda outras construções encostadas ao murro: à direita a habitação do mordomo e, perto desta, outra à qual Nossa Senhora e as santas mulheres às vezes se retiravam, depois da morte de Nosso Senhor. O Cenáculo, antigamente mais espaçoso, servira de morada aos bravos capitães de Davi, que ali se exercitavam no manejo das armas; também estivera ali por algum tempo a Arca da Aliança antes da construção do Templo e ainda há indícios de sua estrada num subterrâneo da casa. Vi também uma vez o profeta Malaquias escondido nos mesmos subterrâneos, onde escreveu as profecias acerca da sagrada Escritura e do sacrifício do Novo Testamento. Salomão tinha também esta casa em muito respeito, por certa relação simbólica, a qual, porém, esqueci. Quando grande parte de Jerusalém foi destruída pelos Babilônicos, ficou salva essa casa, a respeito da qual tenho visto muitas outras coisas, mas lembro-me só do que acabo de contar.
O edifício estava meio arruinado, quando se tornou propriedade de Nicodemos e José de Arimatéia, que restauraram a casa principal e acomodaram-na bem, para a celebração da festa da Páscoa, fim para o qual costumavam alugá-la a forasteiros, como fizeram também na última Páscoa do Senhor. Além disso, serviam-lhes a casa e os pátios de armazém para monumentos sepulcrais e pedras de construção, como também de oficina para os operários, pois José de Arimatéia possuía excelentes pedreiras nas suas terras e negociava em pedras sepulcrais e variadíssimas colunas e capitéis, esculpidos sob sua direção. Nicodemos trabalhava muito como construtor e, nas horas vagas, gostava de ocupar-se também com a escultura, fora da época das festas, esculpia estátuas e monumentos de pedra, na sala ou no subterrâneo debaixo desta. Essa arte pusera-o em contato com José de Arimatéia; tornaram-se amigos e muitas vezes se associaram também nas empresas.
Nessa manhã, enquanto Pedro e João, enviados de Betânia por Jesus, conversavam com o homem que tinha alugado o Cenáculo para aquele ano, vi Nicodemos indo para além e para aquém das casas à esquerda do pátio, para onde tinham sido transportadas muitas pedras, que impediam as entradas da sala do Cenáculo. Havia uma semana, eu vira algumas pessoas ocupadas em pôr as pedras ao lado, em limpar o pátio e preparar o Cenáculo para a celebração da Páscoa; julgo até ter visto, entre outros, alguns discípulos de Jesus, talvez Aram e Temeni, sobrinhos de José de Arimatéia.
A casa principal, o Cenáculo propriamente dito, está quase no meio do pátio, um pouco para o fundo. É um quadrilátero comprido, cercado por uma arcada menos alta de colunas, a qual, afastados os biombos entre pilares, pode ser unida à grande sala interior; pois todo o edifício é aberto de lado a lado e pousa sobre colunas e pilares; apenas estão as passagens fechadas ordinariamente por biombos. A luz entra por aberturas existentes no alto das paredes. Na parte estreita da frente, há um vestíbulo, ao qual conduzem três entradas; depois se entra na grande sala interior, alta e com bom assoalho lajeado; do teto pendem diversas lâmpadas; as paredes estão ornadas para a festa, até meia altura, com belas esteiras e tapetes e no teto há uma abertura coberta com um tecido brilhante, transparente, semelhante à gaze azul.
O fundo da sala está separado do resto por uma cortina igual. Essa divisão do Cenáculo em três partes dá-lhe uma semelhança com o Templo; há também um adro, o santo e o santo dos santos. Nesta última parte é que são guardados, à direita e à esquerda, as vestimentas e vários utensílios. No meio há uma espécie de altar. Sai da parede, um banco de pedra com a ponta cortada no meio das duas faces laterais; deve ser a parte superior do forno, no qual o cordeiro pascal é assado; pois hoje, durante a refeição, estavam os degraus em roda muito quentes. Ao lado dessa parte do Cenáculo, há uma porta, que dá para o alpendre que fica atrás da pedra saliente; de lá é que se desce ao lugar onde se acende o fogo no forno; há ali ainda outros subterrâneos e adegas, debaixo da grande sala.
Naquela pedra ou altar saliente da parede há várias divisões, semelhantes a caixas ou gavetas, que se podem tirar; em cima há também aberturas como de uma grelha, uma abertura também para fazer fogo e outra para apagá-lo. Não sei mais descrever exatamente tudo que ali vi, parece ter sido um forno para cozer o pão ázimo da Páscoa e outros bolos ou também para queimar incenso ou certos restos das refeições da festa; é como uma cozinha pascal. Por cima dele, vi a figura de um cordeiro pascal; tinha cravado na garganta uma faca e o sangue parecia cair gota a gota sobre o altar; não sei mais exatamente como era feito. Dentro do nicho da parede há três armários de diversas cores, os quais se fazem girar como os nossos tabernáculos, para se abrirem e fecharem. Neles vi todas as espécies de vasos para a Páscoa, taças e mais tarde também o SS. Sacramento.
Nas salas laterais do Cenáculo há assentos ou leitos em plano inclinado, feitos de alvenaria, sobre os quais se acham mantas grossas enroladas; são leitos de dormir. Debaixo de todo o edifício há belas adegas; antigamente esteve ali no fundo a Arca da Aliança, onde, em seguida, foi construído o forno pascal. Debaixo da casa há cinco esgotos, que levam todas as águas e imundícies monte abaixo, pois a casa está situada no alto. Já antes vi Jesus curar e ensinar aqui; às vezes passavam alguns discípulos à noite nas salas laterais.
Disposições para a refeição pascal
Tendo os Apóstolos falado com Helí de Hebron, voltou este pátio da casa; eles, porém, se dirigiram para a direita, a Sião, desceram pelo lado norte, passaram uma ponte e, seguindo por veredas ladeadas de sebes verdejantes, foram pelo outro lado do barranco, até às fileiras de casas ao sul do Templo. Ali era a casa do velho Simeão, que morrera depois da apresentação de Jesus no Templo.
Moravam então lá os filhos do venerando ancião; alguns eram secretamente discípulos de Jesus. Os Apóstolos falaram a um deles, que era empregado no Templo; era homem alto e muito moreno. Ele desceu com os Apóstolos, passando a leste do Templo, por aquela parte de Ophel pela qual Jesus entrara triunfalmente em Jerusalém, no domingo de Ramos; assim foram pela cidade, ao norte do Templo, até o Mercado de gado. Vi na parte meridional do mercado pequenos recintos, onde belos cordeiros saltavam como em pequenos jardins.
Na entrada triunfal de Jesus pensei que isso fora feito para abrilhantar a festa; mas eram cordeiros pascais, que se vendiam ali. Vi o filho de Simeão entrar num desses recintos; os cordeiros seguiram-no, saltando, e empurravam-no com as cabeças, como se o conhecessem. Ele escolheu quatro, que foram levados ao Cenáculo. Vi-o também de tarde no Cenáculo, ajudando na preparação do cordeiro pascal.
Vi como Pedro e João deram ainda vários recados na cidade, encomendando muitas coisas. Vi-os também fora de uma porta, ao norte do monte Calvário e a NO da cidade; entraram numa estalagem, onde ficaram nesses dias muitos discípulos, a qual estava sob a administração de Seráfia, (conhecida pelo nome de Verônica). Pedro e João mandaram alguns discípulos de lá ao Cenáculo, para dar alguns recados, dos quais me esqueci.
Foram também à casa de Seráfia, à qual tinham de pedir diversas coisas; o marido desta, membro do conselho, estava a maior parte do tempo fora de casa, em negócios e, mesmo quando estava em casa, ela o via pouco. Seráfia era uma mulher quase de idade da SS. Virgem e há tempo estava em relações com a Sagrada Família; pois quando o Menino Jesus, depois da festa, ficara atrás, em Jerusalém, comera em casa dela.
Os dois Apóstolos receberam ali diversos objetos, em cestos cobertos, que foram levados ao Cenáculo, em parte pelos discípulos. Foi também ali que receberam o cálice de que Nosso Senhor se serviu, na instituição da sagrada Eucaristia.
Jesus vai a Jerusalém
Na manhã em que os dois Apóstolos andaram por Jerusalém, ocupados com os preparativos de Páscoa, Jesus se despediu muito comovido das santas mulheres, de Lázaro e de sua Mãe em Betânia, dando-lhes ainda algumas instruções e exortações.
Vi o Senhor conversar com a Virgem SS. Separadamente; disse-lhes, entre outras coisas, que tinha mandado a Pedro, o representante da fé, e João, o representante do amor, para prepararem a Páscoa em Jerusalém. De Madalena, que estava desvairada de dor e tristeza, disse o Mestre que o seu amor era indizível, mas ainda arraigado na carne e que por isso ficava desatinada de dor. Falou também das intenções traiçoeiras de Judas e a Santíssima Virgem pediu por este.
Judas tinha ido novamente de Betânia a Jerusalém, sob pretexto de fazer várias compras e pagamentos. De manhã interrogou Jesus os nove Apóstolos a respeito, apesar de saber perfeitamente o que Judas estava fazendo. Este correu todo o dia pelas casas dos fariseus, combinando tudo com estes; O traidor premeditou todos os passos que carecia dar, para que pudesse sempre explicar a sua ausência; não voltou para junto de Nosso Senhor, senão pouco antes de comerem o cordeiro pascal. Vi-lhe todas as conspirações e os pensamentos. Quando Jesus falou a Maria acerca de Judas, vi muitas coisas em relação ao caráter deste; era ativo e atencioso, mas cheio de avareza, ambição e inveja e não lutava contra as paixões. Fizera também milagres e curara doentes na ausência de Jesus.
Quando Nosso Senhor comunicou à SS. Virgem o que havia de suceder, pediu ela de modo tocante que a deixasse morrer com Ele. Mas Jesus exortou-a a que mostrasse mais calma na dor do que as outras mulheres; disse-lhe também que ressuscitaria e lhe indicou o lugar onde lhe, apareceria. A Mãe SS. Então não chorou muito, mas ficou tão profundamente triste e séria que impressionou a todos. Nosso Senhor, como Filho piedoso, agradeceu-lhe todo o amor que lhe tinha mostrado; abraçou-o com o braço direito e apertou-a ao coração; disse-lhe também que faria a ceia com ela espiritualmente, indicando-lhe a hora em que a receberia. Ainda se despediu de todos, muito comovido, e instruiu-os sobre muitas coisas.
Cerca de meio dia partiu Jesus de Betânia, com os nove Apóstolos, tomando o caminho de Jerusalém; seguiram-no sete discípulos que, com exceção de Natanael e Silas, eram naturais de Jerusalém e arredores. Lembro-me que entre estes estavam João Marcos e o filho da viúva pobre, que na quinta-feira antecedente oferecera o denário no Templo, enquanto Jesus ensinava. Havia poucos dias Jesus admitira o último como discípulos. As santas mulheres seguiram mais tarde.
Jesus e a comitiva andaram por aqui e por ali, por diversos caminhos ao redor do monte das Oliveiras, no vale de Josafá e até o monte Calvário; durante todo o caminho, continuou a ensinar-lhes. Disse aos Apóstolos, entre outras coisas, que até agora lhes dera pão e vinho, mas hoje queria dar-lhes seu corpo e sangue, que lhes daria e deixaria tudo que tinha. Nosso Senhor disse-o de uma maneira tão tocante, que toda a alma parecia fundir-se Lhe e languir de amor, com o desejo de se lhes dar. Os discípulos não O compreenderam, julgaram que falava do cordeiro pascal. Não se pode exprimir quanto havia de amor e resignação nos últimos discursos que fez em Betânia e aqui. As santas mulheres foram mais tarde à casa de Maria, mãe de Marcos.
Os sete discípulos que seguiram Nosso Senhor a Jerusalém, não O acompanharam no caminho, mas levaram as vestimentas da cerimônia da Páscoa ao Cenáculo, já encontraram todo o vestuário da cerimônia no vestíbulo, onde os discípulos e alguns outros o tinham colocado; também tinham coberto as paredes da sala com tapeçaria, desprendido as aberturas do teto e aprontado três candeeiros de suspensão. Pedro e João foram então ao vale de Josafá, para chamar a Jesus e aos nove Apóstolos. Os discípulos e amigos que comeram com eles o cordeiro pascal vieram mais tarde.
A última ceia pascal
Jesus e os seus comeram o cordeiro pascal no Cenáculo, divididos em três grupos de doze, dos quais cada um era presidido por um chefe, que fazia às vezes de pai de família. Jesus tomou a refeição com os doze Apóstolos, na sala do Cenáculo. Natanael presidiu a outra mesa, numa das salas laterais e outros doze tinham como pai de família Eliaquim, filho de Cléofas e Maria Heli, irmão de Maria Cléofas e que fora antes discípulos de João Batista.
Três cordeiros tinham sido imolados para eles no Templo, com as cerimônias do costume. Mas havia lá um quarto cordeiro, que foi imolado no Cenáculo; foi o que Jesus comeu como os doze Apóstolos. Judas ignorava essa circunstância, pois estava ocupado com diversos negócios e com a traição e ainda não estava de volta, por ocasião da imolação do cordeiro destinado a Jesus e aos Apóstolos foi uma cerimônia singularmente tocante; realizou-se no vestíbulo do Cenáculo; Simeão, que era levita, ajudou. Os Apóstolos e os discípulos estavam também presentes, cantando o salmo 118. Jesus falou então de uma nova época, que começava; disse que então se devia cumprir o sacrifício de Moisés e a significação do cordeiro pascal simbólico; o cordeiro devia por isso ser imolado do mesmo modo que o do Egito, do qual só então o povo de Israel sairia verdadeiramente liberto.
Os vasos e tudo o que era mais precioso, estavam prontos; trouxeram um belo cordeirinho, ornado de uma grinalda, que foi tirada e enviada à SS. Virgem, que ficara com as santas mulheres em outra sala. O cordeiro foi amarrado pelo meio do corpo numa tábua, o que recordou Jesus preso à coluna da flagelação. O filho de Simeão segurou a cabeça do cordeiro para cima; Jesus cravou-lhe a faca no pescoço, entregando-a depois ao filho de Simeão, que continuou a preparação do cordeiro. Jesus parecia sentir dor e repugnância em feri-lo. Fé-lo rapidamente, mas com muita gravidade, o sangue foi colhido numa bacia; trouxeram um ramo de hissopo, que Jesus molhou no sangue. Em seguida avançou para a porta, tingiu com o sangue os dois portais e a fechadura, fixando depois em cima da porta, o ramo tinto de sangue. Durante esse alto, lhes ensinou solenemente e disse, entre outras coisas, que o Anjo exterminador passaria; que fizessem, porém, a adoração naquele lugar, sem medo e inquietação, depois dele, o verdadeiro Cordeiro pascal, ter sido imolado; começaria um tempo e um sacrifício novo, que duraria até o fim do mundo.
Dirigiram-se então ao fogão, no fundo da sala, onde outrora estivera a Arca da Aliança; já estava acesso o fogo. Jesus aspergiu o forno com o sangue e consagrou-o como altar; o resto do sangue e a gordura vazaram-nos no fogo, debaixo do altar. Todas as portas estavam fechadas durante essa cerimônia.
Entretanto, o filho de Simeão acabara de preparar o cordeiro pascal. Pusera-o numa estaca, as pernas dianteiras fixadas num pau transversal, as traseiras na estaca. Ai! parecia tanto com Jesus pregado na Cruz! Em seguida foi posto no forno, para ser assado, junto com os outros três, trazidos do Templo.
Os cordeiros pascais dos judeus eram todos imolados no átrio do Templo, em três lugares diversos: para as pessoas de distinção, para o agente pobre e para os forasteiros. O cordeiro pascal de Jesus não foi imolado no Templo, mas todo o resto da cerimônia foi feita rigorosamente conforme a lei. Jesus falou mais tarde a esse respeito; disse que o cordeiro era simplesmente um símbolo; que Ele mesmo, na manhã seguinte, devia ser o verdadeiro Cordeiro pascal. Não sei mais tudo quanto ensinou nessa ocasião.
Desse modo instruiu Jesus os Apóstolos sobre o cordeiro pascal e sua significação. Por fim veio também Judas. Tendo então chegando a hora, preparam-se as mesas. Os convivas vestiram as vestes da cerimônia, que se achavam no vestíbulo; outro calçado, uma veste branca, à maneira de túnica ou camisa e por cima um manto, curto na frente e comprido atrás; arregaçaram as vestes com o cinto, sendo também as mangas largas arregaçadas. Era o traje de viagem, prescrito pela Lei mosaica. Assim se dirigiu cada grupo à respectiva mesa; os dois grupos de discípulos para as salas laterais, O Senhor e os Apóstolos à sala do Cenáculo.
Tomando todos um bastão na mão, caminharam, dois a dois, para a mesa, onde ficaram em pé diante dos respectivos lugares, os bastões encostados nos braços e as mãos levantadas. Jesus, que estava no meio da mesa, recebera do mordomo dois pequenos bastões, um pouco recurvados em cima, semelhantes a cajados curtos, de pastores. Tinham em cima uma forqueta, a maneira de ramo cortado. Jesus pô-los à altura da cintura, em forma de cruz, diante do peito e durante a oração colocou os braços estendidos sobre as forquetas. Nessa atitude tinham os movimentos do Mestre algo de singularmente tocante e parecia servir-lhe de apoio a cruz, que em pouco tempo devia pesar-lhe sobre os ombros. Nessa posição cantaram: “Bendito seja o Senhor, Deus de Israel” e “Louvado seja o Senhor, etc.”. Terminada a oração, Jesus deu um dos bastões a Pedro e o outro a João. Puseram-nos de lado ou fizeram-nos passar de mão a mão, entre os outros discípulos; já não me lembro mais exatamente.
A mesa era estreita e tão alta, que passava meio pé acima dos joelhos de um homem; tinha a forma de um segmento de círculo. Em frente de Jesus, na parte interior do semicírculo, havia um lugar livre, para servir os pratos. Se bem me lembro, estavam à direita de Jesus: João, Tiago o Maior e Tiago o Menor; no lado estreito, à direita, Bartolomeu; em seguida, no semicírculo interior, Tomé e Judas Iscariotes; à esquerda, Simeão e perto deste, no lado interior, Mateus e Felipe.
No meio da mesa, numa travessa, estava o cordeiro pascal. A cabeça repousava-lhe sobre os pés dianteiros, postos em forma de cruz, as pernas traseiras estavam estendidas; a margem da travessa, em roda do cordeiro, estava coberto de alho. Havia mais uma travessa com o assado da Páscoa, a cada lado desta um prato com ervas verdes, dispostas umas contra as outras, em pé e mais outro prato com trufos de ervas amargas, semelhantes a erva de balsamo. Diante de Jesus havia um prato com ervas de cor verde-amarelada e outro com molho escuro. Pães redondos serviam de pratos para os convivas, que usavam facas de osso.
Depois da oração, o mordomo pôs na mesa, diante de Jesus, a faca para trinchar o cordeiro. Pós também diante de Nosso Senhor um copo de vinho e encheu de um jarro seis copos, cada um para dois discípulos. Jesus benzeu o vinho e bebeu, os Apóstolos beberam, dois a dois em cada copo. O Senhor trinchou o cordeiro; os Apóstolos apresentaram cada um com o seu bolo redondo, com uma espécie de gancho, recebendo cada um a sua parte. Comeram-na apressadamente, separando a carne dos ossos com as facas de osso. Os ossos descarnados foram depois queimados. Comeram também às pressas do alho e da verdura, que ensoparam no molho. Comeram o cordeiro pascal em pé, reclinados apenas um pouco aos encostos dos assentos. Jesus partiu também um dos pães ázimos, recobrindo uma parte; o resto distribuiu. Comeram todos então os respectivos bolos. Trouxeram ainda um cálice de vinho, mas Jesus não bebeu mais. Disse: Tomai este vinho e reparti-o entre vós, pois não beberei mais vinho, até chegar o reino de Deus. Tenho bebido dois a dois, cantaram e em seguida Jesus ainda rezou e ensinou; finalmente todos lavaram as mãos. Só então se deitaram nos assentos. Tudo que precedeu, foi muito depressa, ficando os convivas em pé; somente ao fim se encostaram um pouco aos assentos.
O Senhor trinchara também outro cordeiro, que foi depois levado para as santas mulheres, a um dos edifícios laterais do pátio, onde tomaram a ceia. Comeram ainda ervas e alface com molho. Jesus estava extraordinariamente amável e sereno; nunca o tinha visto assim. Disse também aos Apóstolos que esquecessem tudo que os pudesse angustiar. A SS. Virgem, à mesa das mulheres, estava também muito serena. Comoveu-me profundamente ver como se virava com tanta simplicidade, quando as outras mulheres se lhe aproximavam, puxando-a pelo véu, para lhe falarem.
A princípio Jesus conversou muito amavelmente com os Apóstolos, enquanto ceavam; mas depois se tornou mais sério e triste. “Um de vós me atraiçoará, disse, cuja mão está comigo à mesma mesa.” Jesus serviu alface, de que havia só um prato, àqueles que lhe estavam ao lado; encarregou a Judas, que lhe ficava quase em frente, de distribuí-la pelo outro lado. Os Apóstolos assustaram-se muito, quando Jesus falou do traidor, dizendo: “Um que está comigo à mesma mesa”, ou “que mete a mão no mesmo prato comigo”, o que quer dizer: “Um dos doze que comigo comem e bebem, um daqueles com os quais parto o meu pão”. Com essas palavras não indicou Judas aos outros; pois – “meter a mão no mesmo prato” – era uma alocução geral, indicando relações da maior intimidade. Contudo, quis também dar um aviso a Judas, que no mesmo momento de fato meteu com o Salvador a mão no mesmo prato, para distribuir alface. Jesus disse ainda: “O Filho do Homem vai certamente para a morte, como está escrito a respeito dele, mas ai do homem por quem será traído! Melhor fora nunca haver nascido”.
Os Apóstolos ficaram muito perturbados e perguntaram um após outro: “Senhor, sou eu?” pois todos bem sabiam que nenhum compreendera o sentido daquelas palavras. Pedro inclinou-se para João, por detrás de Jesus e fez-lhe um sinal, para perguntar ao Senhor quem era; pois tendo sido censurado tantas vezes por Jesus, receava que se referisse a ele. Ora, João estava deitado à direita do Senhor e, como todos comiam com a mão direita, encostando-se sobre o braço esquerdo, estava ele com a cabeça perto do peito de Jesus. Aproximou mais a cabeça do peito do Mestre e perguntou-lhe: Senhor, quem é? Então lhe foi revelado que o Senhor se referia a Judas. Não vi Jesus pronunciar as palavras: “É aquele a quem dou o bocado de pão molhado”; não sei se o disse muito baixo a João; este, porém, o percebeu, quando Jesus molhou o pão envolvido em alface e afetuosamente o ofereceu a Judas, que justamente nesse momento perguntava também: “Senhor, sou eu?” Jesus olhou-o com muito amor e deu-lhe a resposta concebida em termos gerais. Era entre os Judeus sinal de amizade e intimidade; Jesus fê-lo muito afetuosamente, para exortá-lo, sem o comprometer perante os outros. Judas, porém, estava com o coração cheio de raiva. Vi, durante toda a ceia, uma pequena figura hedionda sentada aos seus pés, a qual algumas vezes lhe subiu até o coração. Não percebi se João repetiu a Pedro o que ouvira de Jesus; mas vi que o sossegou com um olhar.
O Lava-pés.
Levantaram-se da mesa e, enquanto mudavam e arranjavam as vestes, como costumavam fazer antes da oração solene, entrou o mordomo, com os dois criados, para levar a mesa, tirá-la do meio dos assentos que a cercavam e pô-la ao lado. Tendo feito isso, recebeu ordem de Jesus para trazer água ao vestíbulo e saiu da sala, com os dois criados. Jesus, em pé no meio dos Apóstolos, falou-lhes muito tempo em tom solene. Mas tenho até agora visto e ouvido tantas coisas, que não é possível relatar com exatidão a matéria de todos os discursos.
Lembro-me que falou do seu reino, de sua ida para o Pai, prometendo deixar-lhes tudo o que possuía, etc. Também pregou sobre a penitência, exame e confissão das faltas, arrependimento e purificação. Tive a impressão de que essa instrução se relacionava com o lava-pés e vi também que todos conheceram os seus pecados e se arrependeram, com exceção de Judas. Esse discurso foi longo e solene. Tendo terminado, Jesus mandou João e Tiago o Menor trazerem a água do vestíbulo, ordenando aos Apóstolos que colocassem os assentos em semicírculo, Ele próprio foi ao vestíbulo, despiu o manto e arregaçando a túnica, cingiu-se com um pano de linho, cuja extremidade mais longa pendia para baixo.
Durante esse tempo tiveram os Apóstolos uma discussão, sobre qual deles devia ter o primeiro lugar, como o Senhor lhes anunciara claramente que os ia deixar e que o seu reino estava perto, surgiu de novo entre eles a opinião de que Jesus tinha aspirações secretas, um triunfo terrestre, que se realizaria no último momento.
Jesus, que estava no vestíbulo, deu ordem a João para tomar uma bacia e a Tiago o Menor para trazer um odre cheio de água, transportando-o diante do peito, de modo que o bocal pendesse sobre o braço. Depois de ter derramado água do odre na bacia, mandou que os dois O seguissem à sala, onde o mordomo tinha posto no meio outra bacia maior, vazia.
Entretanto pela porta da sala, de forma humilde, Jesus censurou os Apóstolos em poucas palavras, por causa da discussão havia antes entre eles, dizendo, entre outras coisas, que Ele mesmo queria servir-lhes de criado, que tomassem os assentos, para que lhes lavasse os pés. Então se sentaram, na mesma ordem em que foram colocados à mesa, tendo sido os assentos dispostos em semicírculo. Jesus, indo de um a outro, derramou-lhes sobre os pés água da bacia, que João sucessivamente colocava sobre os pés de cada um. Depois tomava o Mestre a extremidade da toalha de linho, com que estava cingido e enxugava-lhes os pés com ambas as mãos. Em seguida se aproximava, com Tiago, do Apóstolo seguinte. João esvaziava de cada vez a água usada, na grande bacia que estava no meio da sala e Jesus enchia de novo a bacia, com água do odre que Tiago segurava, derramando-a sobre os pés do Apóstolo e enxugando-lhos.
O Senhor, que durante toda a ceia pascal se mostrara singularmente afetuoso, desempenhou-se também desta humilde função com o mais tocante amor. Não fazia como uma cerimônia, mas como ato santo de caridade, exprimindo nele todo o seu amor.
Quando chegou a Pedro, este quis recusar, dizendo: “Senhor, Vós me quereis lavar os pés?”. Disse, porém, o Senhor: “Agora não entendes o que faço, mas entendê-lo-ás no futuro”. Pareceu-me que lhe disse em particular: “Simão, tens merecido aprender de Meu Pai quem Sou Eu, donde venho e para onde vou; só tu o tens conhecido e confessado; por isso, construirei sobre ti a minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela. O meu poder há de ficar também com os teus sucessores, até o fim do mundo”.
Jesus indicou-o aos outros, dizendo-lhes que Pedro devia substituí-lo na administração e no governo da Igreja, quando Ele tivesse saído deste mundo. Pedro, porém, disse: “Vós não me lavareis jamais os pés”. O Senhor respondeu-lhe: “Se eu não tos lavar, não terás parte em mim”. Então lhe disse Pedro: “Senhor, não me lavareis somente os pés, mas também as mãos e a cabeça”. Jesus respondeu: “Quem foi lavado, é puro no mais; não é preciso lavar senão os pés. Vós também estais limpos, mas não todos.” Com estas palavras referiu-se a Judas.
Jesus, ensinando sobre o lava-pés, disse que era uma purificação das faltas quotidianas, porque os pés, caminhando descuidosamente na terra, se sujavam continuamente.
Esse banho dos pés era espiritual e uma espécie de absolvição. Pedro, porém, viu nele apenas uma humilhação muito grande para o Mestre; não sabia que Jesus, para salvá-lo e aos outros homens, se humilharia na manhã seguinte até à morte ignominiosa da Cruz.
Quando Jesus lavou os pés de Judas, mostrou-lhe uma afeição comovedora; aproximou o rosto dos pés do Apóstolo infiel, disse-lhe muito baixo que se arrependesse, pois que já por um ano pensava em tornar-se infiel e traidor. Judas, porém, parecia não querer perceber e falava com João. Pedro irritou-se com isso e disse-lhe: “Judas, o Mestre fala-te”. Então disse Judas algumas palavras vagas e evasivas a Jesus, como: “Senhor, tal coisa nunca farei”.
Os outros não perceberam as palavras que Jesus dissera a Judas, pois falara baixo e eles não prestaram atenção; estavam ocupados em calçar as sandálias. Nada, em toda a Paixão, afligiu tão profundamente o Senhor como a traição de Judas. Jesus lavou depois ainda os pés de João e Tiago. Primeiro, se sentou Tiago e Pedro segurou o odre de água, depois se sentou João e Tiago segurou a bacia.
Jesus ensinou ainda sobre a humildade, dizendo que aquele que servia aos outros, era o maior de todos e que dali em diante deviam lavar humildemente os pés uns aos outros; tocou ainda na discussão sobre qual deles havia de ser o maior, dizendo muitas coisas que se encontram também no Evangelho.
“Sabeis o que vos fiz? Vós me chamais Mestre e Senhor e dizeis bem, porque o sou. Se eu, sendo vosso Senhor e Mestre, vos lavei os pés, logo deveis também lavar os pés uns aos outros. Porque eu vos dei o exemplo, para que, como eu fiz, assim façais vós também. Em verdade, em verdade, vos digo: não é o servo maior do que o seu Senhor, nem o enviado é maior do que aquele que o enviou. Se sabeis estas coisas, bem-aventurados sereis se também as praticardes. Não digo isto de todos vós; sei os que tenho escolhido; mas é necessário que se cumpra o que diz a Escritura: ”O que come o pão comigo, levantará contra mim o calcanhar”. Desde agora vos digo, antes que suceda; para que, quando suceder, creiais que sou eu. Em verdade, em verdade vos digo: “O que recebe aquele que eu enviar, a mim me recebe; e o que me recebe a mim, recebe Aquele que me enviou”. (Jo. 13,12-20).
Jesus vestiu de novo as vestes. Os Apóstolos desenrolaram também as vezes, que antes tinham arregaçado, para comer o cordeiro pascal.
Instituição da Sagrada Eucaristia
Por ordem do Senhor, o mordomo pusera novamente a mesa e colocara-a um pouco mais alto e no meio, coberto de um tapete, sobre o qual estendera uma toalha vermelha e em cima desta, outra branca, bordada a crivo. Por baixo da mesa pôs um jarro de água e outro de vinho.
Pedro e João, indo à parte da sala onde era o forno do Cordeiro pascal, buscaram o cálice que haviam trazido da casa de Seráfia. Transportaram-no solenemente, dentro do invólucro; eu tinha a impressão de que carregavam um Tabernáculo. Colocaram-no sobre a mesa, diante de Jesus. Havia também um prato oval, com três pães ázimos, brancos e delgados, marcados com sulcos regulares; eram por estes divididos em três partes, no sentido da largura e no duplo de partes da largura, no sentido comprimento. Os pães estavam cobertos. Jesus já lhes fizera ligeiras incisões, durante o ceia pascal, para parti-los mais facilmente e pusera por baixo da toalha a metade do pão partido no banquete pascal. Estavam também sobre a mesa um cântaro de água e outro de vinho, como também três vasos, um com óleo grosso, outro com azeite, o terceiro vazio e mais uma espátula.
Desde os antigos tempos reinava o costume de partir o pão e beber do mesmo cálice no fim do banquete; era sinal de fraternidade e amor, usado por ocasião de boa vinda e despedida. Creio que há alguma coisa a este respeito também na Escritura Sagrada. Jesus, porém, elevou esse uso à dignidade do Santíssimo Sacramento. Até então tinha sido somente um rito simbólico e figurativo. Pela traição de Judas foi levado ao tribunal também a acusação de ter Jesus juntado alguma coisa nova às cerimônias da Páscoa; Nicodemos, porém, provou com trechos da Escritura Sagrada, que esse uso de despedida era muito antigo.
O lugar de Jesus era entre Pedro e João. As portas estavam fechadas; tudo se fez com solenidade misteriosa. Depois de se haver tirado do cálice o invólucro e levado à parte separada da sala, rezou Jesus, falando num tom solene. Vi que lhes explicava todas as santas cerimônias da última ceia; era como se um sacerdote ensinasse aos outros a santa Missa.
Em seguida tirou da bandeja em que estavam os vasos, um tabuleiro corrediço, tomou o pano de linho que cobria o cálice e estendeu-o sobre o tabuleiro. Depois o vi tirar do cálice uma patena redonda e pô-la sobre o tabuleiro coberto. Tirou então os pães que estavam ao lado, num prato coberto com um pano de linho e colocou-os na patena, diante de si. Os pães, que tinham a forma de um quadrilátero oblongo, excediam dos dois lados a patena, cuja borda, porém, permanecia visível na largura.
Em seguida puxou para si o cálice, tirou dele um copinho, colocando também os seis copos pequenos à direita e esquerda do cálice. Depois benzeu o pão àzimo e, creio, também os óleos, que estavam ao lado, levantou a patena, em que estavam os pães àzimos, com ambas as mãos, olhou para o céu, rezou e ofereceu-o a Deus, pôs a patena no tabuleiro e cobriu-a. Depois tomou o cálice, mandou Pedro derramar vinho e João derramar água, que antes benzera e juntou ainda um pouco de água, que colheu com a colherzinha. Benzeu o cálice, levantou-o, ofereceu-o, rezando e colocou-o no tabuleiro.
Mandou a Pero e João derramarem-Lhe água sobre as mãos, por cima do prato em que anteriormente foram postos o pães àzimos e, tirando a colherzinha do pé do cálice, apanhou um pouco de água que lhe correra sobre as mãos e espargiu-a sobre as mãos dos dois Apóstolos. Depois passou o prato em redor da mesa e todos lavaram nele as mãos. Não me lembro bem se foi essa a ordem exata das cerimônias; mas tudo isso, que me lembrou muito o santo Sacrifício da Missa, comoveu-me profundamente.
Durante esse santo ato tornou-se Jesus cada vez mais afetuoso; disse-lhes que agora queria dar-lhes tudo que tinha: sua própria pessoa. Era com se derramasse sobre eles todo o seu amor e vi-O tornar-se transparente; parecia uma sombra luminosa.
Orando com esse amor, partiu o pão nas partes marcadas, as quais amontoou sobre a patena, em forma de pirâmide. Do primeiro bocado quebrou um pedacinho com a ponta dos dedos e deixou-o cair no cálice.
No momento em que o fez, tive a impressão de que a SS. Virgem recebeu o Santo Sacramento espiritualmente, apesar de não estar ali presente. Não sei agora como o vi; mas pensei vê-la entrar pela porta, sem tocar no chão aproximar-se de Jesus, do lado desocupado da mesa e receber o santo Sacramento em frente d’Ele; depois não a vi mais. Jesus dissera-lhe de manhã, em Betânia, que celebraria a Páscoa junto com ela, marcando-lhe a hora em que, recolhida em oração, devia recebê-la espiritualmente.
O Senhor rezou ainda e ensinou; todas as palavras lhe saíram da boca como fogo e luz e entraram nos Apóstolos, com exceção de Judas. Depois tomou a patena com os bocados de pão (não sei, mas se a tinha posto sobre o cálice) e disse: “Tomai e comei, isto é o meu corpo, que será entregue por vós”. Nisso estendeu a mão direita como para benzer e, enquanto assim fazia, saiu dEle um esplendor, suas palavras eram luminosas e também o era o pão que se precipitou na boca dos Apóstolos, como um corpo resplandecente; era como se Ele mesmo entrasse neles. Vi-os todos penetrados de luz; só Judas vi escuro.
O Senhor deu o Sacramento primeiro a Pedro, depois a João; em seguida fez sinal a Judas para aproximar-se; foi o terceiro, a quem deu o SS. Sacramento. Mas a palavra do Cristo parecia recuar da boca do traidor. Fiquei tão horrorizada, que não posso exprimir o que senti nesse momento. Jesus, porém, disse-lhe: “Fazei já o que queres fazer” e continuou a dar o Santo Sacramento aos Apóstolos, que se aproximaram dois a dois, segurando alternadamente, em frente um do outro, um pequeno pano engomado, bordado nos lados, o qual cobria o cálice.
Jesus levantou o cálice pelas duas argolas até a altura do rosto e pronunciou as palavras da consagração sobre ele. Nesse ato ficou transfigurado e como transparente, parecendo passar tudo o que lhes deu. Fez Pedro e João beberem do cálice, que segurava nas mãos, colocando-o depois na mesa; João passou com a colherzinha o SS. Sangue do cálice para os copinhos, que Pedro ofereceu aos Apóstolos, os quais beberam dois a dois de um copo. Creio, mas não tenho absoluta certeza, que Judas também participou do cálice; não voltou, porém, ao seu lugar, mas saiu imediatamente do Cenáculo.
Como Jesus lhe tivesse feito um sinal, pensaram os outros que o tivesse encarregado de algum negócio. Retirou-se sem ter rezado e feito a ação de graças, por onde se vê como é mau retirar-se sem ação de graças, depois de tomar o pão quotidiano ou o Pão Eterno. Durante toda a refeição, eu tinha visto ao pé de Judas a figura de um pequeno monstro vermelho e hediondo, cujo pé era como um osso descarnado e que ás vezes lhe subia até o coração. Quando saiu de casa, vi três demônios cercarem-no; um entrou-lhe na boca, outro empurrou-o para frente e o terceiro correu-lhe à frente. Era noite e eles pareciam alumiá-lo; Judas corria como um louco.
O Senhor deitou o resto do Santíssimo Sangue, que ainda ficara no fundo do cálice, no copinho que antes estivera dentro do cálice; pondo depois os dedos por cima do cálice, mandou Pedro e João derramarem água e vinho sobre eles. Feito isso, fê-los beber ambos do cálice e o resto vazou-os nos outros copinhos, distribuindo-os pelos outros Apóstolos. Em seguida Jesus enxugou o cálice, meteu nele o pequeno copo, contendo o resto do Santíssimo Sangue, colocou em cima a patena, com os restantes pães àzimos consagrados pôs a tampa e cobriu o cálice de novo com o pano, colocando-o depois sobre a bandeja, entre os seis copinhos. Vi os Apóstolos comungarem dos restos do Santíssimo Sacramento, depois da ressurreição de Jesus.
Não me lembro de ter visto o Senhor comer as espécies consagradas, a não ser que eu não reparasse. Dando o Santíssimo Sacramento, deu-se de modo que parecia sair de si mesmo e derramar-se nos Apóstolos, numa efusão de amor misericordioso. Não sei como posso exprimi-lo.
Também não vi Melquisedec, quando ofereceu pão e vinho, come-lo e bebê-lo. Soube também porque os sacerdotes o consomem, apesar de Jesus não o ter feito.
Dizendo isso, Catharina Emmerich virou de repente a cabeça, como para escutar; recebeu uma explicação sobre esse ponto, da qual pôde comunicar somente o seguinte; “se, porém, os sacerdotes não o recebessem, já se teria perdido há muito; por isso é que se conserva”.
Todas as cerimônias, durante a instituição do SS. Sacramento, foram feitas por Jesus com muita calma e solenidade, para ao mesmo tempo ensinar e instruir os Apóstolos, os quais vi depois tomarem notas de certas coisas, nos pequenos rolos que tinham consigo. Todos os movimentos de Jesus, para a direita e para a esquerda, eram solenes, como sempre que estava rezando. Tudo mostrava em geral o santo Sacrifício da Missa. Durante a cerimônia e em outras ocasiões, vi também os Apóstolos se inclinarem uns diante dos outros ao aproximarem-se, como ainda fazem os sacerdotes de hoje.
Instruções secretas e consagrações
Jesus deu ainda instruções secretas. Disse aos Apóstolos que continuassem a consagrar e administrar o SS. Sacramento, até o fim do mundo. Ensinou-lhes as formas essenciais da administração e do uso do Sacramento e de que modo deviam gradualmente ensinar e publicar esse mistério; explicou-lhes quando deviam receber o resto das espécies consagradas e dá-lo à SS. Virgem e que deviam consagrar também o SS. Sacramento, depois de lhes ter enviando o Divino Consolador.
Instruiu-os em seguida sobre o sacerdócio, sobre a preparação do Crisma e dos santos óleos e sobre a unção. Estavam ao lado do cálice três urnas, duas das quais continham misturar de bálsamo e diversos óleos e algodão; as urnas podiam ser postas em cima da outra. Jesus ensinou-lhes muitos mistérios, como se devia preparar o santo Crisma, a que partes do corpo se devia aplicar e em que ocasiões.
Lembro-me, entre outras coisas, que mencionou um caso em que a sagrada Eucaristia não podia mais ser recebida; talvez se tenha referido à Extrema-Unção: mas as minhas lembranças a tal respeito não são muito claras. Falou ainda de diversas unções, inclusive a dos reis e disse que os reis sagrados com o Crisma, mesmo os injustos, possuíam uma força interna misteriosa, que não era dada aos outros. Derramou, pois, ungüento e óleo na urna vazia e misturou-os; não sei mais positivamente se foi nesse momento ou já por ocasião da consagração dos pães, que benzeu o óleo.
Vi depois Jesus ungir a Pedro e João; já por ocasião da instituição do SS. Sacramento lhe derramara sobre as mãos a água que sobre as suas lhe correra e os fizera também beber do cálice que Ele mesmo segurava.
Saindo do meio da mesa, um pouco para o lado, pousou as mãos primeiro sobre os ombros e depois sobre a cabeça de Pedro e João. Em seguida mandou que ficassem de mãos postas e colocassem os polegares em forma de cruz. Inclinaram-se os dois Apóstolos profundamente diante do Mestre (não sei ai estavam de joelhos). O Senhor ungiu-lhes os polegares e indicadores com ungüento e fez-lhes com o mesmo também o sinal da cruz na cabeça. Disse-lhes também que essa unção devia permanecer com eles até o fim do mundo.
Tiago o Menor, André, Tiago o Maior e Bartolomeu receberam também ordens. Vi também o Senhor ajustar em forma de cruz, sobre o peito de Pedro, a faixa estreita de pano, que todos traziam ao pescoço; aos outros, porém, do ombro direito para debaixo do braço esquerdo. Não sei mais com certeza se isso se fez já por ocasião da instituição do SS. Sacramento ou só na hora da unção.
Vi porém, que Jesus lhes comunicou com essa unção uma coisa real e também sobrenatural, não sei como exprimi-lo em palavras. Disse-lhes mais que, depois de terem recebido o Espírito Santo, deviam também consagrar pão e vinho e dar a unção aos outros Apóstolos. Nesse momento tive uma visão sobre Pedro e João que, no dia de Pentecostes, antes do grande batismo, impuseram as mãos aos outros Apóstolos, o que também fizeram, uma semana depois, a alguns outros discípulos. Vi também João, depois da ressurreição de Jesus, dar pela primeira vez o SS. Sacramento a Nossa Senhora. Esse acontecimento foi celebrado pelos Apóstolos com grande solenidade; a Igreja militante não tem mais essa festa, mas vejo-a celebrada ainda na Igreja triunfante. Nos primeiros dias depois de Pentecostes vi só Pedro e João consagrarem a santa Eucaristia, mais tarde a consagraram também os outros.
O Senhor benzeu-lhes também fogo, num vaso de bronze; esse fogo desde então ardeu sempre, até depois de longas ausências era guardado junto ao lugar onde se conservava o SS. Sacramento, numa parte do antigo fogão pascal; ali sempre o buscavam para as cerimônias religiosas.
Tudo que Jesus fez por ocasião da instituição da sagrada Eucaristia e da unção dos Apóstolos, foi debaixo de grande segredo e era também ensinado só secretamente e tem se conservado, na sua essência, pela Igreja até os nossos tempos, aumentando, porém, sob a inspiração do Espírito Santo, conforme as necessidades.
Os Apóstolos ajudaram na preparação e bênção do santo Crisma; quando Jesus os ungiu e lhes impôs as mãos, fez tudo com grande solenidade.
Terminadas as santas cerimônias, o cálice, perto do qual estavam também os santos óleos, foi coberto com a capa e Pedro e João levantaram assim o SS. Sacramento para o fundo da sala, separado do resto por uma cortina e ali era desde então o Santuário. O SS. Sacramento estava por cima do fogão pascal, não muito alto. José de Arimatéia e Nicodemos cuidavam do Santuário e do Cenáculo, na ausência dos Apóstolos.
Jesus ensinou ainda por muito tempo e disse algumas orações com grande fervor. Parecia às vezes conversar com o Pai celeste, cheio de entusiasmo e amor. Os Apóstolos também ficaram penetrados de zelo e ardor e fizeram-lhe várias perguntas, às quais respondeu. Creio que tudo isso está escrito em grande parte na Escritura Sagrada. Durante esses discursos, disse Jesus algumas coisas a Pedro e João separadamente, as quais estes depois deviam comunicar aos outros Apóstolos, como complemento de instruções anteriores e estes aos outros discípulos e às santas mulheres, quando chegassem ao tempo de receberem tais conhecimentos.
Pedro e João estavam sentados perto de Jesus. O Senhor teve também uma conversa particular com João, da qual me lembro agora apenas o prognóstico de que a vida deste Apóstolo seria mais longa que a dos outros; falou-lhe também de sete Igrejas, de coroas, Anjos e outras figuras simbólicas, com as quais designava, como me parece, certas épocas. Os outros Apóstolos sentiram, diante dessa confiança particular, um leve movimento de inveja.
O Mestre falou também diversas vezes do traidor, dizendo o que naquela hora este estava fazendo; viu sempre Judas fazer o que o Senhor dizia. Como Pedro lhe afirmasse, com grande ardor, que havia de permanecer fiel, disse-lhes Jesus: “Simão, Simão, eis que Satanás vos reclama com instância, para vos joeirar como o trigo; mas eu roguei por ti, afim de que tua fé não desfaleça; e tu enfim, depois de convertido, confirma na fé teus irmãos”. Como, porém, Jesus dissesse que onde iria, não poderiam seguí-lo, exclamou Pedro que o seguiria até a morte. Replicou Jesus: “Em verdade antes que o galo cante duas vezes, tu me negarás três vezes”, Quando lhes anunciou os tempos duros que viriam, pergunto-lhes: “Quando vos enviei sem alforje, sem sapatos, faltou-lhes porventura alguma coisa?” Responderam: “Não”. Disse, porém, que daquela hora em diante, quem tivesse bolsa, a tomasse e também alforje e o que nada tivesse, vendesse a túnica e comprasse espada, pois que se devia cumprir a palavra: “E foi reputado por um dos iníquos”. Tudo que fora escrito sobre Ele, devia cumpri-se então.
Os Apóstolos entenderam-no no sentido natural e Pedro mostrou-Lhe duas espadas curtas e largas, como cutelos.
Jesus disse: “Basta, vamo-nos daqui”. Rezaram então um cântico; a mesa foi posta ao lado e dirigiram-se todos ao vestíbulo.
Ali se aproximaram a mãe de Jesus, Maria de Cleofas e Madalena, que lhe pediram instantemente que não fosse ao monte das Oliveiras; pois se propagara o boato de que queriam apoderar-se dEle. Mas Jesus consolou-as com poucas palavras, continuando apressadamente o caminho; eram cerca de 9 horas da noite. Descendo a grandes passos pelo caminho pelo qual Pedro e João tinham vindo ao Cenáculo, dirigiram-se ao monte das Oliveiras.
Oração solene de despedida de Jesus
Não podemos deixar de inserir aqui as últimas palavras e ensinamentos tão profundos, que Jesus, no fim da ceia, dirigiu aos Apóstolos, com tanto amor e carinho e que nos foram transmitidos por S. João no seu Evangelho, Caps. 14 a 17. Jesus disse:
“Não se perturbe o vosso coração. Credes em Deus, crede também em mim. Na casa de meu Pai há muitas moradas; se assim não fora, eu vo-lo teria dito: pois vou a aparelhar-vos o lugar. E depois que eu for e vos aparelhar o lugar, virei outra vez, e tomar-vos-ei comigo, para que onde eu estiver, estejais vós também, para onde eu vou, sabeis vós e sabeis também o caminho”. Disse-lhe Tomé: “Senhor, não sabemos para onde vias, e como podemos saber o caminho?” Respondeu-lhe Jesus: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida; ninguém vai ao Pai senão por mim. Se me conhecêsseis a mim, também certamente havíeis de conhecer meu Pai; mas conhecê-Lo-eis bem cedo e já o tendes visto”. Disse-lhe Filipe: “Senhor, mostrai-nos o Pai e isso nos basta”. Respondeu-lhe Jesus: “Há tanto tempo que estou convosco e ainda não me tendes conhecido? Filipe, quem vê a mim, vê também ao Pai. Como dizes logo: “Mostra-nos o Pai?” Não credes que estou no Pai e o Pai está em mim? As palavras que vos digo, não as digo de mim mesmo, mas o Pai, que está em mim, é que faz as obras. Não credes que estou no Pai e que o Pai está em mim? Crede ao menos por causa das mesmas obras. Em verdade, em verdade vos digo que aquele que crê em mim, fará também as obras que faço e fará outras ainda maiores; porque vou para o Pai. E tudo o que pedirdes ao Pai em meu nome, eu vo-lo farei, para que o Pai seja glorificado no Filho.
Se me amais, guardais os meus mandamentos. E rogai ao Pai e Ele vos dará outro Consolador, para que fique eternamente convosco, o Espírito da verdade, a quem o mundo não pode receber, porque não o vê, nem o conhece; mas vos deixarei órfãos; virei a vós. Resta ainda um pouco, depois já o mundo não me verá; mas ver-me-eis vós, porque eu vivo e vós vivereis. Naquele dia conhecereis que estou em meu Pai e vós em mim e eu em vós. Aquele que tem os meus mandamentos e que os guarda, esse é o que me ama. E aquele que me ama, será amado de meu Pai e eu o amarei também e me manifestarei a ele”.
Disse-lhe Judas, não o Iscariotes: “Senhores, donde procede que te hás de manifestar a nós e não ao mundo?” Respondeu-lhes Jesus: “Se alguém me ama, guardará a Minha palavra e meu Pai o amará e viremos a ele e faremos nele morada. O que não me ama, não guarda as minhas palavras. E a palavra que tendes ouvido, não é minha, mas, sim, do Pai que me enviou. Eu vos disse estas coisas, permanecendo convosco; mas o Consolador, que é o Espírito Santo, a quem o Pai enviará em meu nome, vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar tudo o que vos tenho dito. A paz vos deixo, a minha paz vos dou; eu não vo-la dou como a dá o mundo. Não se turbe o vosso coração, nem fique sobressaltado. Já tendes ouvido que eu vos disse: Eu vou e venho a vós. Se me amardes, certamente haveis de alegrar-vos, que vou para junto do Pai, é maior do que Eu. Eu vo-lo disse agora, antes que suceda, para que, quando suceder, o creiais. Já não falarei muito convosco, porque vem o príncipe deste mundo e ele não tem em mim coisa alguma. Mas, para que o mundo conheça que amo o Pai e que faço como me ordena. Levantai-vos, vamo-nos daqui.
Eu sou a verdadeira videira e meu Pai é o agricultor. Todo ramo que não der fruto em mim, Ele o cortará e todos os que derem fruto, limpá-los-á, para que o dêem mais abundante. Vós já estais puros, em virtude da palavra que eu vos disse. Permanecei em mim e eu permanecerei em vós. Como o ramo da videira não pode de si mesmo dar fruto, se não permanecer na videira, assim nem vós podereis dar, se não permanecerdes em mim. Eu sou a videira, vós sois os ramos; o que permanece em mim e em quem eu permaneço, dá muito fruto; porque vós sem mim não podeis fazer nada. Se alguém não permanecer em mim, será lançado fora com o ramo e secará e enfeixá-lo-ão e lançá-lo-ão ao fogo e ali arderá.
Se permanecerdes em mim e as minhas palavras permanecerem em vós, pedireis tudo o que quiserdes e ser-vos-á feito. Nisso é glorificado meu Pai, em que vós deis muito fruto e em que sejais meus discípulos. Como meu Pai me amou assim vos amei. Permanecei no meu amor. Se guardardes os meus preceitos, permanecereis no meu amor, assim como também eu guardei os preceitos de meu Pai e permaneço no seu amor. Disse-vos estas coisas, para que o minha alegria esteja em vós e que a vossa alegria seja completa. O meu preceito é este: que vos ameis uns aos outros, como eu vos amei. Ninguém tem maior amor do que este de dar a própria vida pelos amigos. Vós sereis meus amigos, se fizerdes o que vos mando. Já vos não chamarei servos; porque o servo não sabe o que faz o seu senhor. Mas chamei-vos amigos, porque vos revelei tudo quanto ouvi de meu Pai. Não fostes vós que me escolhestes a mim, mas fui eu que vos escolhi a vos constitui, para que vades e deis fruto e para que o vosso fruto permaneça, para que tudo quanto pedirdes a meu Pai, em meu nome, Ele vo-lo conceda. O que eu vos mando, é que vos ameis uns aos outros. Se o mundo vos odeia, sabei que primeiro do que a vós, me odiou a mim. Se fôsseis do mundo, o mundo vos amaria como sendo seus; mas porque não sois do mundo, mas do mundo que vos escolhi, por isso é que o mundo vos odeia.
Lembrai-vos da minha palavra que eu vos disse: Não é o servo maior do que o seu senhor. Se me perseguiram a mim, também vos hão de perseguir a vós. Se guardaram a minha palavra, também vos hão de perseguir a vós. Se guardaram a minha palavra, também hão de guardar a vossa. Mas vos farão tudo isto por causa de meu nome, porque não conhecem aquele que me enviou. Se eu não viesse e não lhe tivesse falado, não teriam pecado; mas agora não há desculpa para o seu pecado. Aquele que me odeia, odeia também a meu Pai. Se eu não tivesse feito entre eles tais obras, como nenhum outro fez, não haveria da parte deles pecado; mas agora não somente as viram, mas ainda me odiaram, tanto a mim como a meu Pai. Mas é para se cumprir a palavra que está escrita na lei (Sal. 34,19; 68,5): “Eles me odiaram sem motivo”. Quando, porém, vier o Consolador, o Espírito da verdade, que procede do Pai, que eu vos enviarei da parte do Pai, Ele dará testemunho de mim; e também vós dareis testemunho, porque estais comigo desde o princípio.
Eu vos disse estas coisas, para que não vos escandalizeis. Eles vos lançarão fora das sinagogas e está a chegar o tempo em que todo o que vos matar, julgará que nisso faz serviço a Deus. E assim vos tratarão, porque não conhecem o Pai, nem a mim. Ora, eu vos disse estas coisas, para que, quando chegar esse tempo, vos lembreis de que eu vo-las disse. Não vo-las disse, porém, desde o princípio, porque estava convosco. E agora vou para aquele que me enviou; e nenhum de vós pergunta: Para onde vais? Antes, porque eu vos disse estas coisas, se apoderou do vosso coração a tristeza. Mas eu vos digo a verdade; a vós vos convém que eu vá porque, se eu não for não virá a vós o Consolador; mas, se eu for, vo-Lo enviarei. E Ele, quando vier, convencerá o mundo do pecado, da justiça e do juízo. Sim, do pecado, porque não creram em mim. E da justiça, porque vou para o Pai e não me vereis mais. E do juízo, enfim, porque o príncipe deste mundo já está julgado e condenado. Tenho ainda muitas coisas a vos dizer, mas não as podeis suportar agora. Quando vier, porém, o Espírito da verdade, ele vos ensinará todas as verdades, porque não falará de si mesmo, mas dirá tudo que tiver ouvido e anunciar-vos-á as coisas que estão para vir. Ele me glorificará, porque há de receber do que é meu e vo-lo há de anunciar. Um pouco e já me não vereis; e outra vez um pouco e verme-eis; porque vou para o Pai.
Disseram então alguns discípulos uns para os outros. “Que vem a ser isto que Ele nos diz: “Um pouco e já me não vereis e outra vez um pouco e ver-me-eis, porque vou para o Pai”? E diziam: “Que vem a ser isto, que Ele nos diz: um pouco… Não sabemos o que quer dizer”. E entendeu Jesus que lho queriam perguntar e disse-lhes: “Vós perguntais uns aos outros o que é que vos quis significar, quando disse: Um pouco e já me não vereis e outra vez um pouco e ver-me-eis. Em verdade, em verdade vos digo que haveis de chorar e gemer e que o mundo se há de alegrar e que haveis de estar tristes, mas que a vossa tristeza se há de converter em gozo. Quando uma mulher dá à luz, está em tristeza, porque é chegada a sua hora; mas, depois que lhe nasceu um filho, já se não lembra do aperto, pelo gozo que tem, de haver nascido ao mundo um homem. Assim também vós outros sem dúvida estais agora tristes, mas hei de ver-vos de novo e o vosso coração ficará cheio de alegria e esta ninguém vo-la tirará.
E naquele dia nada mais me perguntareis. Em verdade, em verdade vos digo: se pedirdes ao meu Pai alguma coisa em meu nome, ele vo-la há de dar. Até agora não pedistes nada em meu nome. Pedi e recebereis, para que a vossa alegria seja completa. Tenho vos dito estas coisas debaixo de parábolas. Está chegando o tempo, em que já não vos hei de falar por parábolas, mas abertamente vos falarei do Pai. Naquele dia pedireis em meu nome e não vos digo que hei de rogar ao Pai por vós. Porque o mesmo Pai vos ama, porque vós me amastes e, crestes que saí de Deus. Eu saí do Pai e vim ao mundo; outra vez deixo o mundo e torno para o Pai”. Disseram-lhe os discípulos: “Eis que agora nos falava abertamente e não usas de parábola alguma; agora conhecemos que sabeis tudo e que não é necessário fazer-te perguntas; nisto, cremos que saíste de Deus.”Respondeu-lhes Jesus: “Credes agora? Eis que aí vem e já e chegada a hora em que sejais espalhados, cada um para seu lado e que me deixeis só; mas não estou só, porque o Pai está comigo. Tenho vos dito estas coisas, para que tenhais paz em mim. Haveis de ter aflições no mundo; mas tende confiança, eu venci o mundo”.
Assim falou Jesus e, levantando os olhos ao céu, disse: – “Pai, é chegada a hora, glorifica a teu Filho, para que teu Filho te glorifique a ti; assim como tu lhe deste poder sobre todos os homens, afim de que Ele dê a vida eterna a todos que lhe deste. A vida eterna, porém, consiste em que conheçam por um só verdadeiro Deus a ti e a Jesus Cristo, que enviaste. Glorifiquei-te sobre a terra; acabei a obra de que me encarregaste. Tu, pois, agora, Pai, me glorifica a mim em ti mesmo, com aquela gloria que tive em ti, antes que houvesse mundo. Manifestei o teu nome aos homens que me deste do mundo. Eles eram teus e mos deste e eles guardaram a tua palavra. A gora conheceram eles que todas as coisas que me deste, vêm de ti. Porque lhes dei as palavras que me deste; e eles ao receberam e conheceram verdadeiramente que saí de ti e creram que me enviaste. Por eles é que rogo; não rogo pelo mundo, mas por aqueles que me deste, porque são teus e todas as minhas coisas são tuas e todas as tuas coisas são minhas; e neles sou glorificado. E não estou mais no mundo, mas eles estão no mundo e eu vou para junto de ti.
Pai santo, guarda em teu nome aqueles que me deste, para que sejam um, assim como também nós. Quando eu estava com eles, guardava-os em teu nome. Conservei os que me deste e nenhum destes se perdeu, mas somente o que era filho da perdição, para se cumprir a Escritura. Mas agora vou para junto de ti e digo estas coisas, estando ainda no mundo, para que eles tenham em si mesmos a plenitude da minha alegria. Dei-lhes a tua palavra mas o mundo os odeia, porque não são do mundo, como também eu não sou do mundo. Não peço que os tires do mundo, mas, sim, que os guardes do mal.
Eles não são do mundo, como eu também não sou do mundo. Santifica-os na verdade. A tua palavra é a verdade. Assim como me enviaste ao mundo, também eu os enviei ao mundo. E santifico-me a mim por eles, para que também sejam santificados pela verdade. E não rogo somente por eles, mas rogo também por aqueles que hão de crer em mim por meio das palavras; para que sejam todos um, como tu, Pai, o és em mim e eu em ti, para que também eles sejam um em nós e creia o mundo que enviaste. Dei-lhes a glória que me havias dado, para que sejam um, como nós também como um. Eu estou neles e tu estás em mim, para que eles sejam consumados na unidade e para que o mundo conheça que me enviaste e que os amaste como amaste também a mim.
Pai, a minha vontade é que, onde eu estiver, estejam também comigo aqueles que me deste, para verem a minha glória, que me deste; porque me amaste antes da criação do mundo. Pai justo, o mundo não te conheceu, mas eu te conheci e estes conheceram que me enviaste. E eu lhes fiz conhecer o teu nome e lho farei ainda conhecer, afim de que o mesmo amor com que me amaste, esteja neles e eu neles.
Fonte: Extraído do Livro “Vida, Paixão e Glorificação do Cordeiro de Deus – Anna Catharina Emmerich – Ed. MIR.
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