Estudo 11 – O Evangelho como me foi revelado Cap.11 – Escola da Vontade Divina

Estudo 11 – O Evangelho como me foi revelado Cap.11 – Escola da Vontade Divina
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MEDITAÇÃO
11. Maria confidencia o seu voto ao Sumo Sacerdote.

3 de setembro de 1944.

Que noite de inferno! Parecia mesmo que os demônios estivessem soltos sobre a terra. Canhonaços, trovões, relâmpagos, perigo, medo, sofrimento por estar em uma cama não minha e, em meio a tudo isso, como uma flor toda branca e suave, colocada entre labaredas e espinheiros, a presença de Maria, que está um pouco mais adulta do que na visão de ontem, mas sempre jovem, com as suas tranças loiras sobre os ombros, com o seu vestido branco, com seu sorriso doce e cheio de recolhimento, um sorriso interior, voltado para o mistério glorioso, que ela acolheu em seu coração. Passo a noite comparando o seu suave aspecto com a ferocidade que há no mundo, e relembrando suas palavras de ontem cedo, um canto de viva caridade, com o ódio dos que se dilaceram.

Agora de manhã, tendo voltado ao silêncio do meu quarto, assisto a esta cena.
Maria está sempre no Templo. Agora, ela está saindo com outras virgens do Templo verdadeiro e propriamente dito.

Lá dentro deve ter havido alguma cerimônia, pois o cheiro do incenso se espalha pelo ar, que está todo avermelhado por causa de um belo pôr-do-sol, que eu diria de um outono adiantado, com um céu docemente cansado, como um outubro sereno, inclinando-se sobre os jardins de Jerusalém, nos quais o amarelo-ocre das folhas, estando para cair, vão derramando manchas loiro-avermelhadas no verde-prateado das oliveiras.

A fileira, ou melhor, o cândido enxame das virgens, atravessa o pátio dos fundos, sobe por uma escadaria, passa por uma série de pórticos, entra em um outro pátio mais simples, quadrado, tendo uma única entrada. Deve ser este o lugar que serve para acomodar os pequenos quartos das virgens destinadas ao Templo, pois cada menina se dirige para a sua cela, como uma pombinha para o seu ninho, e até parece um bando de pombas que se separam, depois de estarem unidas respondendo a um apelo. Muitas, eu diria todas, falam entre si em voz baixa e alegre, antes de se separarem. Maria está calada. Somente antes de se separar das outras, ela as saúda afetuosamente, depois se dirige para o seu pequeno quarto, que fica num canto à direita.

Lá, ela se encontra com uma mestra também anciã, embora não tanto quanto Ana de Fanuel.
– Maria, o Sumo Sacerdote te espera.
Maria olha para ela, ligeiramente surpresa, mas não lhe pergunta nada. Responde só isto:
– Irei imediatamente.
Não sei se a ampla sala em que ela entra faz parte da casa do Sacerdote, ou se faz parte dos aposentos das mulheres que trabalham no Templo. Só sei que é uma sala vasta e muito clara, bem arrumada, onde, além do Sumo Sacerdote, majestoso em suas vestes, estão também Zacarias e Ana de Fanuel.
Maria faz uma grande reverência na entrada, não continuando a entrar até que o Sumo Sacerdote lhe diga:

– Adiante, Maria. Não temas. – Maria ergue, então, de novo o corpo, e vai para a frente devagar, não porque queira, mas por um movimento involuntário que lhe dá um ar solene, fazendo-a parecer, de fato, uma mulher.

Ana sorri para ela, para dar-lhe coragem, e Zacarias a saúda, dizendo:
– A paz esteja contigo, prima.
O Pontífice a observa atentamente, e depois diz a Zacarias:
– Nela se vê logo a estirpe de Davi e de Arão.
– Minha filha, eu conheço a tua graça e bondade. Sei que cada dia vieste crescendo na ciência e na graça, aos olhos de Deus e dos homens. Sei que a voz de Deus murmura ao teu coração as mais doces palavras. Sei que tu és a Flor do Templo de Deus e que um terceiro querubim está diante do Testemunho, desde quando tu lá estás. Eu gostaria que o teu perfume continuasse a subir com o incenso em cada novo dia. Mas as palavras que a Lei diz são outras.

Tu não és mais uma menina, mas uma mulher. E toda mulher deve ser esposa em Israel, para levar ao Senhor o seu filho varão.
Tu cumprirás a ordem da Lei. Não tenhas medo, não fiques envergonhada. Estou bem lembrado da tua realeza. A própria Lei já tutela essa condição, quando ordena que a cada homem seja dada a mulher da sua estirpe. Ainda que assim não fosse, assim eu o faria, para não corromper o teu nobilíssimo sangue. Não conheces, Maria, alguém da tua estirpe, que possa ser o teu esposo?
Maria ergue o rosto, todo ruborizado de pudor, e sobre o qual, dos cílios das pálpebras vem brotando um primeiro sinal de pranto, e com voz trémula, responde:

– Ninguém.
– Mas ela não pode conhecer alguém, porque entrou aqui em sua infância, e a estirpe de Davi tem sido perseguida e dispersa de tal modo, que não foi possível que os diversos ramos se reunissem como em uma fronde, formando a copa da palmeira real – diz Zacarias.
– Então, vamos deixar para Deus a escolha.
As lágrimas, até aí contidas jorram agora, e descem até à boca trémula, e Maria lança um olhar suplicante à sua mestra.

– Maria fez um voto ao Senhor pela sua glória e pela salvação de Israel. Naquele tempo ela não passava de uma menina, estava aprendendo a soletrar, e já se tinha obrigado por um voto…- diz Ana em sua ajuda.

– O teu pranto, então, é por isso? Não é por resistência à Lei?
– É por isso… e não por outra causa. Eu obedeço a ti, Sacerdote de Deus.
– Isto vem confirmar tudo o que sempre me foi dito de ti. Há quantos anos que fizeste essa promessa de virgindade?*
 Desde sempre, penso. Ainda não estava neste Templo, e já me havia entregue ao Senhor.
– Não és tu aquela pequenina que, faz agora doze invernos, vieste pedir-me para entrar?
– Sou eu.
– E como podes dizer que naquele tempo já eras de Deus?

– Se olho para trás, vejo-me consagrada já ao Senhor. Não posso lembrar-me da hora em que nasci, nem de como foi que comecei a amar a minha mãe e a dizer a meu pai: “Meu pai, eu sou tua filha”… Mas eu me lembro, ainda que não saiba quando começou, de ter dado a Deus meu coração.
Talvez tenha sido com o primeiro beijo que eu soube dar, com a primeira palavra que eu consegui pronunciar, com o primeiro passo que eu fui capaz de dar… Sim, isso mesmo. Creio que a primeira recordação de amor, vou encontrá-la no primeiro passo firme que eu consegui dar… Minha casa… tinha um jardim cheio de flores… tinha um pomar e muitos campos… e lá havia uma nascente, bem lá no fundo, ao sopé de um monte, e a nascente jorrava de uma rocha escavada, que formava uma gruta… era cheia de ervas de talos longos e finos, que ficavam penduradas como pequenas cascatas verdes, que vinham de diversas direções e parecia que estivesse chovendo, porque as folhinhas leves das pequenas copas semelhantes a um bordado, tinham uma gotinha de água em cada uma que, ao pingar, fazia o som de uma campainha, bem pequenina. E a nascente também cantava.

Lá havia passarinhos nos ramos das oliveiras e das macieiras, que estavam na encosta acima da nascente, pombas brancas, que vinham lavar-se no espelho límpido da água da fonte… Eu não me lembrava mais de tudo aquilo, porque eu tinha colocado todo o meu coração em Deus e, com exceção do pai e da mãe, amados por mim na vida e na morte, quaisquer outras coisas da terra tinham desaparecido do meu coração… Mas tu me estás fazendo pensar, Sacerdote… Devo descobrir quando foi que me dei a Deus… e por isso as coisas dos primeiros anos estão voltando à minha mente… Eu amava aquela gruta, porque, mais doce do que o canto da água e dos passarinhos, lá eu ouvia uma Voz que me dizia: “Vem, minha querida!”.

Eu amava aquelas ervas ornadas com gotas sonoras e parecidas com lindos diamantes, porque nelas eu via o sinal do meu Senhor, e me tornava alheia a tudo mais, ao dizer a mim mesma: “Vê como é grande o teu Deus, ó minha alma! Aquele que fez os cedros do Líbano, lá no Norte, fez também aqui estas folhinhas que se inclinam sob o peso de um mosquitinho, para alegria dos teus olhos e como anteparo para os teus pequenos pés”. Eu amava aquele silêncio das coisas puras: o vento leve, a água prateada, o asseio das pombas… eu amava aquela paz que velava sobre a pequena gruta, descendo das macieiras e das oliveiras, agora todas em flor, e depois todas carregadas de frutos… E não sei… parecia que a Voz me dissesse: “Vem, tu, minha oliva linda; vem, tu, doce maçã; vem, tu, fonte selada; vem, tu, ó minha pomba”… Doce, o
amor do pai e da mãe… doce era a voz deles que me chamava… mas esta voz, esta voz!

 Oh! No Paraíso terrestre, penso que foi assim que a ouviu aquela que foi a culpada, e eu nem sei como foi que ela pôde preferir um sibilo a esta Voz de amor, como pôde apetecer um outro conhecimento, que não fosse o de Deus… Com os lábios, que ainda estavam com o cheiro do leite materno, mas com o coração tornado ébrio pelo mel celeste, eu disse, então: “Eis-me aqui, eu vou. Sou tua. E nenhum outro senhor terá a minha carne, senão Tu, Senhor, como outro amor não tem o meu espírito”… Parecia-me estar repetindo coisas já ditas e estar cumprindo um rito há tempo realizado, nem era estranho para mim o Esposo escolhido, porque Dele conhecia já o ardor e minha vista estava já afeita à sua luz, e minha capacidade
de amar se havia completado entre os seus braços. Quando foi? Não sei. Do lado de lá da vida, eu diria, porque sinto que sempre o tive, e que Ele sempre me teve, e que eu existo porque Ele me quis para alegria do seu Espírito e do meu… Agora, eu obedeço, Sacerdote.
Mas diz-me tu, como é que deverei agir. Não tenho pai nem mãe. Sé tu o meu guia.

– Deus te dará o esposo, e santo ele há de ser, pois te entregas a Deus. Tu contarás ao teu esposo qual é o teu voto.

– E ele aceitará?

– Assim espero. Reza, ó filha, para que ele possa compreender teu coração. Vai agora. Deus te acompanhe sempre.
Maria se retira com Ana. Zacarias fica com o Pontífice.
Cessa assim a visão.

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