A PARTIDA.
Chegada a hora da partida, tomou-me a dileta Mãe pela mão, junto com José. Saímos daquela cidade, sem qualquer provisão, mas só confiados na providência de meu Pai. Havendo saído da cidade, voltei-me para trás, e alçando a destra, abençoei-a, suplicando ao Pai confirmasse sobre ela a bênção que dera e de novo lha recomendei. Começando a viagem, disse à querida Mãe que cantasse um novo canto de ação de louvor e graças ao Pai. Logo começou a cantar tão suavemente e com tanto gosto de meu Pai, meu e de José, que caminhamos um grande trecho da estrada sem sentirmos cansaço algum. Ofereci estes cânticos ao dileto Pai e pedi-lhe que por aquela sua e minha complacência se dignasse dar a todos os meus irmãos tanta graça que, ao ouvirem os louvores divinos, ficassem consolados no íntimo, e não sentissem cansaço no seu serviço. Assim se animem cada vez mais à fadiga e a todas aquelas ações que, em seu serviço, lhes possam trazer tédio e cansaço. O Pai prometeu-me fazê-lo, embora em muitos não cause estes efeitos a graça que Ele lhes comunica, porque a intenção deles não é inteiramente sincera, a vontade está manchada de amor próprio e o motivo de agir não é só para a glória e o serviço de meu Pai. Em conseqüência, não sentem aqueles efeitos admiráveis que a graça divina costuma causar numa alma verdadeiramente fiel,
COMBINAM O PASSO
Eu andava minha esposa, embora sendo menino pequeno, com passo igual à de minha e José, enquanto eles se acomodavam à minha fraqueza de criança e eu a sua condição; Esforçava-se por segui-los, . Ofereci ainda isso ao Pai e embora fosse uma coisa assim mínima, era contudo muito grande, porque feita por mim. Estando a minha humanidade unida à divindade, qualquer obra minha era de mérito e valor Infinitos. Pedi ao Pai que, em virtude daquela união que procurava obter, acomodando-me aos passos da divina Mãe e José, se dignasse dar graça e virtude a todos os meus irmãos, e de fazer cada um deles se acomodar à vontade de outrem naquelas coisas que são para sua glória e gosto: fazer com que cada um deles se acomodasse à debilidade e fraqueza do irmão enfermo e débil, e que este se esforce o mais possível por seguir a robustez de quem é mais forte e válido do que ele. Assim, unidos, acomodando-se um à condição do outro, sirvam ao Pai com paz e tranquilidade de espirito e cheguem ao fim visado: à aquisição da glória eterna.
Via que nisto muitos falhariam; e pedia com grande instância ao Pai que inserisse em seus corações essa bela virtude e união, da qual depende todo o proveito que deve uma alma tirar do serviço divino; se faltar essa virtude, tudo falta. O Pai me prometia fazê-lo. Mas, eu bem via que muitos e muitos haveriam de falhar: deixar-se-iam enganar nisto pelo amor próprio e pelo inimigo infernal, que com todo o seu poder se afadiga e empenha por abolir do mundo essa virtude de caridade e união com o próximo. Pedia-o com mais instancia ao Pai, e oferecia-lhe o pesar que experimentava, o qual na verdade era muito grande, porquanto este é um vicio assaz contrario à virtude e aquilo que eu viera ensinar. Meu Pai aceitava aquilo que eu fazia e oferecia-lhe com grande amor. Mostrava-se pronto a dar a todos nova graça em troca daquilo que recebia de mim e aplacava-se. Os meus irmãos muito o excitavam à ira pela pouca caridade e unanimidade entre si, pois não queriam compadecer-se mutuamente, nem suportar um a fraqueza do outro, enquanto meu Pai suporta inúmeras falta, imperfeições e defeitos de todos, e acomoda-se à vontade deles nas coisas que lhes são proveitosas. Pedia-lhe ainda se dignasse conceder luz a todos para conhecerem esta verdade, e assim à minha imitação, soubessem acomodar-se e concordar entre si: muito mais se animassem a fazê-lo ao ver que não só não desdenhei praticá-lo, mas cumpri-o com tanto gosto, amor e resignação; e isto por amor deles e para deixar-lhes um exemplo perfeito. Rogava ao Pai abençoasse e desse nova graça a todos aqueles que me tivessem imitado. Tinha a todos presentes, olhava-os com amor e impetrava-lhes muitas graças, em particular a perseverança final, nesta como em todas as haverem tido, muitas vezes faltam outras virtudes. Meu Pai benignamente mo concedeu e agradeci-lhe por parte de todos, também por aqueles que ainda não tinham o ser, e depois de o haverem tido, ainda faltam neste ponto. Por isso supri a omissão de todos. Ficou meu Pai inteiramente satisfeito.
AS BÊNÇÃOS DE JESUS
Prosseguindo assim nossa viagem, ia dando a benção por todos os lugares por onde passava e pedia a meu Pai se dignasse fazer com que aquelas estradas e lugares fossem habitados por pessoas que lhe dessem muita glória, lá o servissem fielmente, imitassem a minha vida e praticassem as minhas virtudes. O Pai prometeu-me fazer, como efetivamente fez depois, enquanto por seu particular impulso, muitos, tendo deixado o mundo e todas as suas comodidades e riquezas, se retiraram a estes desertos e campos para poderem levar uma vida mais angélica do que humana, e aqueles lugares se transformaram em escolas de toda a virtude e perfeição. Quanto me alegrava, esposa minha, ao ver que nisto se realizaria a promessa de meu Pai pelo pedido que fiz, de modo que eu, por gratidão para com o Pai, prostrei-me por terra e, genuflexo, adorei-o e agradeci-lhe tamanho beneficio.
Orei por uma assistência e cuidado particular para com todos aquelas que ali fossem levados por Impulso divino, com intenção de lá fazerem sua morada em vigílias e penitências, para glória de meu Pai e imitação minha, a fim de depois conseguirem o prêmio, prometido por meu Pai a quem deixar tudo para seguir me e imitar-me. Supliquei-lhe ainda para todos o dom da perseverança. porque via que muitos haveriam de faltar quanto a isto por instigação do Inimigo infernal, o qual, com várias espécies de tentações e muitas astúcias, se empenharia por fazê-los retroceder do bem iniciado. Por isso, rezei ainda a meu Pai se dignasse freiar a besta infernal, dar aqueles tanta luz que pudessem conhecer as suas astúcias e lisonjas e simultaneamente graça para superarem-nas. O dileto Pai tudo me prometeu, como de fato o realizou e ainda o vai executando, não deixando jamais de dar luz, graça e virtude àqueles todos que se acham em semelhante estado, a fim de que possam preservar-se das insídias e sibilas do inimigo tentador, que odeia ferozmente todos aqueles que se põem a seguir-me e a imitar-me, porque sabe quão grande é o bem que eles fazem e a grande recompensa que lhes está preparada, como ainda o dano e ruína que a esse inimigo advém pelas perdas que assim sofre. Por isto jamais repousa, sempre gira e regira, e como cão raivoso tenta morder quem se opõe a seus perversos desígnios. Mas, efetivamente a imundíssima fera nada pode fazer, se não lho permite meu Pai. Assim todas as suas fraudes e insídias servem a meus irmãos para aumentar-lhes o mérito e a glória, enquanto eles as superam e vencem com a graça de meu Pai.
JESUS NOS BRAÇOS DE JOSÉ E DE MARIA
Havendo já caminhado um grande trecho, estava muito cansado; percebeu-o minha dileta Mãe enquanto participante de todos os padecimentos que sentia em minha humanidade. Ofereceu-se junto com José para levar-me sucessivamente nos braços. Aceitei para dar-lhes aquela consolação, unia vez que também eles estavam muito atribulados pela viagem. Consenti que primeiro minha querida Mãe me carregasse nos braços por algum tempo, depois José, no intuito de, em tal ocasião, consolar um e outro. Roguei, portanto, ao Pai fizesse que não sentissem peso nem fardo algum, e ainda que os consolasse e revigorasse mais para poderem prosseguir viagem, pois estavam eles igualmente muito cansados e sem conforto humano. Havendo minha Mãe me tomado nos braços, entendeu logo o favor da virtude divina que em mim habitava e cheia de alegria e revigorada quanto às forças corporais, andava sem dar atenção a isso, sem sentir fardo, nem peso, ao invés, com muita alegria e consolação. Depois de algum tempo entregou-me a José, pois assim lhe ordenei. Operaram-se os mesmos efeitos em José, mas não com aquela sublimidade de efeitos que minha dileta Mãe experimentava. Assim, tanto um como outro, prosseguiram o caminho com regozijo, sem fadiga, nem cansaço. Eu, no entanto, ofereci aquela caridade e amor a meu Pai e supliquei-lhe se dignasse conceder graça idêntica a todos os meus irmãos. principalmente aqueles que se exercitam de meu Pai, em semelhantes atos de caridade, isso é, todos os que por amor querem assumir as fadigas insustentáveis para o próximo enfermo e débil, e que, visando proporcionar- lhe refrigério e aliviá-lo nas tribulações, substituíam-no nas fadigas ou em outras obras que o irmão não pode suportar. Por eles pedi ao Pai que, visto fazerem-no eles por amor seu e para imitar-me, desse-lhes graças para não sentirem fadiga ou tédio ou peso que a obra lhes possa trazer. Concedesse-lhes tanta graça que naquela ação, e obra de caridade experimentassem muita consolação e conforto de espírito. E se aquilo, que se faz por amor de uma criatura não causa enjôo ou tédio a quem ama, convém muito mais que as obras feitas por amor de meu Pai não provoquem tédio, fastio ou cansaço. Ao invés. encha-se a alma de celeste consolo espiritual, de virtude e força para praticar coisas cada vez maiores para a glória do Pai e para proveito próprio, e utilidade do próximo necessitado e angustiado.
Tudo isto me prometeu fazer o Pai com particular cuidado e providência, como de fato o vai realizando. Pode a respeito dar verdadeiro testemunho quem nisto se vai exercitando, e verdadeirameme o faz por amor de meu Pai, sem outro interesse. Quem assim age, não pode negar ter sentido todos aqueles efeitos que já mencionei; e se não os experimente é por não ser a sua vontade inteiramente perfeita, nem o amor verdadeiro. Pois, onde se encontra genuíno amor e boa vontade, encontra-se ainda tudo o que referi. Eu o impetrei de meu Pai e Ele, tendo me prometido, não pode falhar, nem falhará jamais. Via, porém. que muitos falhariam nisto, por ai misturarem fins peculiares não inteiramente retos. Sentia pesar por ver que não davam a meu Pai aquele gosto que lhe teriam dado se agissem com reta intenção e também, porque eles perdem o mérito da obra, e ao agirem, não recebem o prémio por eles esperado, devido ao defeito inerente. Disto sentia pesar e rogava com grande instância ao Pai se dignasse purificar-lhes a intenção, aperfeiçoar-lhes a vontade, a fim de que, tendo-se afadigado, não fossem depois frustrados do prêmio preparado. Também nisto atendeu-me o Pai. E, em verdade, não deixa de insinuar continuamente ao coração daqueles que nisto se exercitam, que purifiquem a própria intenção, aperfeiçoar-lhes a vontade, afim de que tendo se afadigado, não fossem frustrados do prêmio esperado.
Também nisto atendeu-me o Pai, e em verdade não deixa de insinuar continuamente ao coração daqueles que nisto se exercitam, que purifiquem a própria intenção e mantenham liberta a vontade de qualquer complacência, vaidade, e outras que lhes possa fazer perder o mérito das próprias ações. Muitos deles aproveitavam, e executavam quanto meu Pai sugeria-lhes com as divinas inspirações. Disto me alegrava e rendia graças ao Pai. Impetrava-lhes nova graça e virtude. Porém entristecia-me, por causa dos que abusavam e não davam ouvidos à divina inspiração, mas seguiam seus ditames e faltas atenções. Para suprir-lhes a falta, oferecia ao Pai as minhas retas intençõe, ao agir só para a sua maior gloria e satisfação, que por estes últimos lhe era negada. Muito aprazia meu dileto Pai, tudo o que eu fazia e frequentemente me dizia: ¨Meu filho amado e dileto! Encontro em ti todas as minhas delícias e complacências e de ti recebo toda a glória, e mais me alegro em ti sozinho do que em todas elas juntas, mesmo se fossem perfeitas e santas¨. Eu ao ouvir estas palavras, experimentava na alma, e também em minha humanidade novo gáudio pela complacência de meu dileto Pai.
Oferecia-lhe este gáudio que experimentava e por ele suplicava-lhe não se irar contra meus irmãos delinquentes, mas suportá-los e sustentá-los com longanimidade e provê-los com seu amor paterno. Pedia-lhe, por aquele gáudio e aquele prazer que Ele experimentava em mim, que se dignasse consolar todos os meus irmãos aflitos e angustiados no caminho da virtude, dos quais via muitos. O Pai benigno e amoroso me atendeu em quanto lhe pedi, com todo amor e solicitude.
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